segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

HÁ ALGO DE PODRE NO REINO DA DINAMARCA
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Está em curso, em Copenhague, a capital da Dinamarca, a maior conferência climática da história, com 20 mil delegados de 192 países, gerando expectativa enorme e uma bela lista de impasses. No país nórdico encontram-se ambientalistas, políticos, cientistas, imprensa, turistas, curiosos, cada qual com seu posicionamento e interesse. E nós, como nos inserimos nessa questão? Aquecimento global, mudanças climáticas, poluição, energia, água, lixo, consumo estão na nossa agenda diária de preocupações? Ou isso quem resolve é o governo e a sociedade não têm nada a ver com a iminência de uma catástrofe de proporções inimagináveis? Afinal, o que se discute em Copenhague?
A polêmica maior está nas metas de redução de gases-estufa e na falta de recursos financeiros para que os países mais pobres se adaptem aos efeitos da mudança do clima e criem economias mais limpas. Cada nação apresenta uma meta de redução das emissões de gases que, no conjunto, apresenta-se desigual, levando em conta pontos de partida diferentes e uma matemática de emissões pouco transparente. E o maior problema é que essas metas muito abaixo do que os cientistas avisam ser necessário para evitar o aquecimento excessivo da Terra.
Os Estados Unidos falam em cortes de emissão de 17% em 2020 em relação a 2005. A União Européia promete 20% em 2020 em comparação a 1990 e 30% se os EUA e a China pactuarem igual meta. Outro ponto de atrito no mundo dos ricos é que a meta dos EUA não cobre todos os setores de sua economia - a agricultura, por exemplo, está de fora. Nas grandes economias emergentes também há uma diversidade de percentuais.
Brasil, China e Índia anunciaram suas propostas de redução de gases-estufa, o que faz com que suas delegações cheguem fortalecidas a Copenhague. O Brasil promete de 38% a 42% de corte na tendência crescente de emissões até 2020. Isso significa 15% de redução, em 2020, em relação aos níveis de emissão de gases-estufa de 2005, diminuindo radicalmente o desmatamento na Amazônia (80%) e no Cerrado (40%).
China e Índia estabeleceram outro parâmetro. Os chineses prometem 40% a 45% de corte na intensidade de emissões em 2020 em relação a 2005, patamar insuficiente para o planeta, segundo os especialistas. A Índia anunciou uma redução na intensidade de carbono (uma medida que relaciona a emissão de gases-estufa por unidade de PIB) de 20% a 25% em 2020 sobre os níveis de 2005. Já pelos industrializados, a maior promessa é a da Noruega, de 40%.
Mas, todas as metas, em conjunto, são muito inferiores ao que os cientistas avaliam ser necessário para combater as mudanças climáticas. Segundo o relatório do IPCC, o órgão científico da ONU, divulgado em 2007, a redução de gases-estufa feita pelos países ricos deveria ser de 25% a 40% entre 2013 e 2020. As atuais propostas indicam redução entre 10 e 24%.
Toda essa parafernália de números e promessas nos fazem chegar a uma conclusão óbvia - nenhum país quer abrir mão de seu processo de desenvolvimento em nome de um possível cataclisma que, sabe-se lá, quando vai acontecer...É revoltante verificar que a competição econômica, a dancinha das cadeiras do poder é mais importante do que a preservação da vida na Terra!
E não é por falta de aviso. Há anos que o planeta manda telegramas, cartas, e-mails e toda sorte de informação comunicando que o equilíbrio está por um fio – geleiras se desprendem da calota polar; secas e enchentes se multiplicam; furacões, ciclones e tornados acontecem em locais antes improváveis, causando devastação e morte; frio e calor congelam e torram a natureza e o homem. E não são interpretados como aviso?
Definitivamente, haverá algo de podre no reino da Dinamarca nestes dias de dezembro se as autoridades responsáveis pelo destino da Terra não chegarem a um consenso mínimo que permita um novo recomeço.
E nós, indivíduos, gente, povo, sociedade, inquilinos deste planeta ainda azul, temos consciência do perigo que nos espreita e dos bilhetes desesperados por mudança que ele escreve sem parar? Além do alerta que vem de cima, pelo estrago diário que cometemos, devemos lembrar que, além do problema ecológico, aqui, no Brasil, temos um problema sanitário; nossa verdadeira tragédia ambiental é o fato de que 50% da população não dispõe de rede de esgotos ou de que dois terços dos esgotos são lançados nos rios sem tratamento nenhum. Na Amazônia, onde há o maior volume de água doce do mundo, a maioria da população não tem água decente para beber. Nas área pobres das cidades, o lixo não é coletado - acaba em rios, represas ou na rua. A questão ecológica real, no Brasil, chama-se pobreza."
Mas o governo brasileiro prefere gastar milhões para assegurar que o filme Lula, o Filho do Brasil, seja assistido por toda a população mais pobre do país, garantindo-lhe o essencial - pão, circo e voto, bem melhor do que água encanada e esgoto. Afinal, obra enterrada não aparece, nem elege ninguém... O tempo, o vento, o apagão, o desmatamento da Amazônia, isso a gente discute na Dinamarca, bem longe, para não atrapalhar o lançamento do filme...
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Nivia Andres, jornalista, graduada em Comunicação Social e Letras pela UFSM, especialista em Educação Política. Atuou, por muitos anos, na gestão de empresa familiar, na área de comércio. De 1993 a 1996 foi chefe de gabinete do Prefeito de Santiago, Rio Grande do Sul. Especificamente, na área de comunicação, como Assessora de Comunicação na Prefeitura Municipal, na Associação Comercial, Industrial e de Serviços (ACIS), no Centro Empresarial de Santiago (CES) e na Felice Automóveis. Na área de jornalismo impresso atuou no jornal Folha Regional (2001-06) e, mais recentemente, na Folha de Santiago, até março de 2008.
Blog:
http://niviaandres.blogspot.com/
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