quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

TERÇA-FEIRA, 1 DE FEVEREIRO DE 2010

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.Como prometido no artigo anterior, revelamos outro episódio envolvendo nosso glorioso Aristides Murara, competente técnico de externa da Rádio Diário do Grande ABC que, ao contrário da simpática Salomé, encontrou pela frente num estádio um servidor fiel, dedicado, zeloso e disposto a cumprir a risca as determinações que lhe foram passadas por seus superiores. Neste caso, um fiscal da Federação Paulista de Futebol (FPF).
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Era domingo de fevereiro de final dos anos 1980 e havia um sol para cada habitante da cidade de Campinas, onde ocorreu esta história, num grande jogo entre Guarani e Santos pelo Paulistão. O time campineiro estava bem no campeonato e o Santos, como sempre, atração em qualquer lugar. Assim, o Estádio Brinco de Ouro da Princesa, campo do Bugre, como também é conhecido o Guarani, estava apinhado de torcedores.

As cabines de Imprensa são acanhadas, uma espécie de cubículo, comportando apenas narrador e comentarista, desde que um dos dois não seja obeso. Lá nos aboletamos e instalamos os apetrechos da Rádio Diário do Grande ABC. A equipe, nesse domingo, era formada por Edward de Souza (narrador), eu (comentarista), Sidney Lima (repórter) e Aristides Murara, responsável para colocar a transmissão no ar, com a conexão da linha entre Campinas e São Bernardo, sede da rádio. Com tudo certo na cabine, Murara desceu ao gramado para instalar o equipamento do repórter de campo. O calor superava os 30 graus e, certamente poderia cozinhar ou fritar ovos, se expostos ao sol. No campo, vários outros operadores de rádio e televisão exercendo sua função natural em transmissões externas.
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Meio incomodado com o calor e para amenizar a fornalha, Aristides Murara tirou sua camisa e a deixou na cabine com os companheiros. Lá embaixo, iniciou o trabalho de instalação da aparelhagem do repórter da Diário. Na cabine, semelhante a um micro-ondas, eu e o Edward apenas aguardávamos o momento de entrar no ar, com a equipe toda, e cumprir mais uma rotina de trabalho, como tantas outras realizadas em transmissões externas. No entanto, do cubículo notamos algo anormal entre o nosso Murara e um cidadão de jaleco laranja (que identificava os fiscais da FPF). Os dois gesticulavam e estavam aos berros, mas não conseguimos captar do que se tratava em virtude da distância considerável.

Outras pessoas que estavam no gramado se aglomeraram para assistir a pendenga entre o funcionário da Rádio Diário e o servidor da Federação Paulista. Ameaçando acionar a polícia o rapaz da FPF não deu alternativas ao nosso Aristides Murara, que deixou o local e retornou à cabine. Lá chegando foi indagado por nós sobre o ocorrido. Nervoso, rosto vermelho de raiva e do sol, foi dizendo: "o fiscal da Federação não quis me deixar trabalhar sem camisa; respondi que ela estava nas cabines de rádio, mas o cara não quis saber". "Bem, e precisava discutir tanto?, indaguei. "eu disse ao fiscal que se os atletas jogam de calção, por que eu não poderia trabalhar sem camisa? resmungou o Murara, "aí o sujeito me chamou de ignorante e estúpido”. Disse-lhe que não tinha autoridade pra impedir que eu trabalhasse no campo, com ou sem camisa. “Então o fiscal ameaçou acionar o polícia e, antes que eu fosse retirado a força, resolvi sair", completou nosso agitado operador.
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Como o trabalho teria que ser feito, sugeri a ele que colocasse a camisa e retornasse ao campo, já que não seria conveniente trabalhar sem o repórter neste importante jogo. A contragosto, Murara colocou a camisa e desceu para o gramado. No entanto, foi barrado pelo chefe dos fiscais, acionado pelo subordinado que pintou a história com as cores que lhe interessavam. A transmissão aconteceu sem repórter, somente com narrador e comentarista. Vale lembrar que havia no gramado outras pessoas, inclusive repórteres e operadores de som de outras emissoras, sem camisa. Consta que, percebendo isso, o chefe dos fiscais da FPF ordenou aos seus subordinados que exigissem de todos no campo que colocassem a camisa. Sem intenção, o fiscal escolheu, aleatório, o Murara como o primeiro a receber a determinação. Vendo que os demais trabalhavam normalmente sem camisa, nosso companheiro, que nunca havia recebido tal determinação, além de surpreso, ficou irritado e foi ríspido na resposta ao rapaz da FPF. Daí para o atrito foi apenas questão de segundos.

No retorno ao Grande ABC, Murara indagava inconformado: "pô, não entendo, o campo fica cheio de gente (jogadores) só de calção e o cara veio logo implicar comigo porque estava sem camisa?". Em parte nosso "Rapunzel" (charge ao lado), tinha alguma razão. Do Rio de Janeiro para cima, com o calor e alta temperatura, o pessoal da Imprensa já sai de casa só bermuda, vai à praia e com a mesma vestimenta trabalha nos estádios, nas cabines e no gramado. Hoje, por determinação da Fifa, esse procedimento é proibido nos estádios do mundo inteiro, com ou sem calor.
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*Oswaldo Lavrado é jornalista/radialista radicado no ABC.
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