segunda-feira, 25 de outubro de 2010

DOMINGO, 24 DE OUTUBRO DE 2010



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Nas muitas andanças da equipe de esportes da Rádio Diário do Grande ABC pelo Interior de São Paulo ou por tantas outras cidades brasileiras, foram necessários, de acordo com a distância e localização, vários tipos de transportes que provocaram algumas situações embaraçosas, como já foi descrito em artigos neste blog.
Uma quarta-feira de abril, no final dos anos 80, a equipe, então composta por Edward de Souza (narrador), Jurandir Martins (repórter), Agapito Assunção (operador de som), o motorista da viatura da rádio (Lampião) e eu (comentarista), esteve em Franca – 400 quilômetros de São Paulo - com a missão de transmitir um jogo entre a Francana e o Santo André, disputado no Estádio José Lancha Filho (Lanchão).
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Como Franca é a cidade natal do Edward, onde residem seus pais, irmãos, primos e tios, nosso companheiro exigiu que a equipe se hospedasse na residência de sua família até o sábado seguinte, já que no domingo iríamos transmitir um jogo em Jaú, envolvendo o XV de Novembro e o Santo André. Convite feito, convite aceito. Apenas o motorista (Lampião), por motivos profissionais imediatos, retornou ao Grande ABC. Ficamos na casa do "sêo" Arlindo (pai do Edward) e, tratados como reis, nos sentimos donos do pedaço.
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Depois do jogo entre Francana e Santo André, que terminou empatado em 1 x 1, ficamos livres de compromissos, a não ser nos fins de tarde, quando apresentávamos os programas esportivos da Rádio Diário, (das 18h às 19h, transmitidos de Franca para a Grande São Paulo, diretamente da mesa da sala da residência do “sêo” Arlindo, com o equipamento utilizado nos estádios. Tudo nos conformes. A casa do “sêo” Arlindo fica (ainda é a mesma, apenas reformada), bem próxima ao centro da cidade. Talvez uns três ou quatro quarteirões.
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Na quinta-feira depois do almoço e de um bom papo com os pais do Edward, percebi que meus amigos foram todos tirar uma soneca. Resolvi dar umas voltas, a pé, até o centro da cidade, ver de perto o famoso relógio de sol, (foto a direita) que, segundo contam em Franca, só existe um igual no mundo, numa cidade da França. O calor era forte, temperatura acima dos 30 graus, normal naquela região. Entrei numa lanchonete, na esquina da praça central e solicitei um suco para refrescar-me. Na hora de pagar a conta foi que percebi que não tinha um tostão nos bolsos. Havia esquecido o dinheiro na casa dos pais do Edward. Envergonhado, aproximei-me da proprietária do estabelecimento, uma jovem e gentil senhora, explicando a ela o meu problema. Disse que era amigo do Edward, que durante muito tempo foi radialista em Franca, e estava hospedado na casa dos seus pais, onde havia deixado por descuido a carteira com o dinheiro. Antes que continuasse, a senhora tranquilizou-me, dizendo que poderia pagá-la em outra oportunidade. Até hoje não sei se ela conhecia o Edward ou se foi com minha cara. Certo é que voltei depois e paguei pelo suco que havia tomado, claro, agradecendo a proprietária da lanchonete pela gentileza e confiança.
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No sábado pela manhã, café tomado, juntamos a parafernália da rádio para viajar até Jaú, não muito distante de Franca. No momento das despedidas o Edward se irritou em virtude de pequena discussão entre sua mãe (saudosa dona Dalva) e o irmão mais novo, (Arlindinho, também já falecido). O rapaz pretendia vir e ficar alguns dias na casa do irmão em Santo André. A mãe não queria deixar e iniciou-se pequena pendenga entre o Arlindinho e dona Dalva (coisa de mãe e filho). No entanto, prevaleceu a vontade da mãe. Já no portão da casa, aparece um tio do Edward, que os mais íntimos chamam (está vivo e forte), de “Nenê”, que, talvez para quebrar o gelo, pergunta: "por que vocês vão a Jaú?" Fuzilando, o Edward respondeu, aos berros: "vamos a Jaú porque Jaú não pode vir até aqui". Nada mais foi dito nem perguntado, não precisava.
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Calmo e paciente, "sêo" Arlindo, em sua Brasília impecável, nos conduziu até a rodoviária de Franca, onde tomamos um ônibus para Jaú. O coletivo, provavelmente dos anos 50, chacoalhou sua lataria por uma estrada de terra, parando em todas as goiabeiras que encontrava, para apanhar passageiros, além de entrar em uma escola, onde subiram uns 15 barulhentos alunos. Produzindo uma fumaceira e uma poeira incríveis (eram tipo 11h00, com sol escaldante a pino), o ônibus destrambelhava pela estrada. Dentro, alguns passageiros oriundos de algumas colônias que rumavam para onde, ninguém sabe, e os barulhentos pivetes da escola rural. Eu e o Edward estávamos acomodados em uma poltrona (poltrona?) no fundo do coletivo e o Agapito (nosso operador de som) livre, leve e solto, sozinho em um banco duplo, certo que ganharia na loteria se uma garota bela e faceira entrasse no ônibus e viesse sentar-se ao seu lado. Ele, Agapito, era (já faleceu), um crioulo alto, simpático, forte, sempre risonho, perto dos 50 anos, calmo, boa praça e grande companheiro.
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Em uma parada entrou (no ônibus) um negão, tipo dois metros de altura, meio desdentado, faltando um dedo na mão esquerda que se acomodou no lugar vago ao lado do nosso Agapito. Atrás, eu e o Edward não sabíamos como disfarçar o riso diante da esdrúxula situação do nosso companheiro, que sonhava ter ao seu lado uma, digamos, Mariana Ximenes ou Camila Pitanga. Ele, no entanto, não se atrevia a olhar para trás, receando denunciar nosso riso ao parceiro de poltrona, que caso se irritasse, deixaria a situação ruim (e coloca ruim nisso) para o nosso lado. Era um brutamontes. Mas nada de diferente ocorreu que pudesse complicar nossa "confortável e aconchegante" viagem.
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Chegamos por volta das 13h00 na estação rodoviária de Jaú e com toda a parafernália da rádio (maletas, malas e cerca de 200 metros de fios para o campo), que pesavam uns 50 quilos. fomos de táxi, a um hotel. Até a hora do jogo, no domingo, às quatro da tarde, o assunto não foi outro que não o desconforto do Edward com o tio "Nenê" (que se atreveu a perguntar: "por que vocês vão a Jaú?", e a inusitada viagem de ônibus (ônibus?) que nos conduziu até Jaú. Além, claro, da companhia que inibiu nosso saudoso Agapito em seu banco no ônibus e da gafe que cometi na lanchonete no centro de Franca, esquecendo de levar dinheiro para pagar a conta. Este artigo, simplório, é mais um relato do tipo de aventura, entre tantas, que uma equipe convive na gratificante profissão de radialista/jornalista esportivo.
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*Oswaldo Lavrado é jornalista/radialista radicado no Grande ABC
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