quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Velhos tempos dos ladrões de galinhas


Edward de Souza

Nos bons tempos de minha infância, a maior vergonha do mundo era ser ladrão de galinha, o último dos estigmas, a pena de morte social, o fim da picada. Não havia internet, mas todo mundo sabia quem era o ladrão de galinha, pela rede global do boca-a-boca, do disse-me-disse. Era tão eficaz e eficiente essa comunicação pré-eletrônica que até o ladrão de galinha tinha vergonha de ser ladrão de galinha
É bom destacar que nessa época existia também a figura do colarinho branco, que sempre esteve em nossa história política. Sua fama também corria oralmente, mas havia o quê de benevolência por parte de quem murmurava, ao votar no mesmo crápula, que ele tinha uma grande vantagem em relação aos seus adversários políticos: roubava, mas fazia.
Talvez a diferença básica entre o colarinho branco de antigamente e o sanguessuga de hoje esteja exatamente na intensidade do "rouba, mas faz".
Hoje, além de roubarem, os políticos nada fazem para o povo sofrido e a divulgação constante os transforma em verdadeiros assaltantes, tão próximos da figura de um traficante de morro - que por sua vez, faz mais á uma comunidade favelada do que os tais políticos. Triste inversão de valores!
Um amigo radialista, anos atrás, lançou um desafio através de uma pergunta: Qual a diferença entre Político e Ladrão? Um ouvinte respondeu todo orgulhoso: após longa pesquisa cheguei a esta conclusão: a diferença entre o ladrão e o político é que, um eu escolho, o outro me escolhe. Estou certo?
Por falar em políticos e ladrões de galinhas, lembrei-me de uma história deliciosa. Pra mim, as melhores são aquelas inverossímeis que, se fossem verdadeiras, tornariam a realidade bem mais interessante. Existe uma, clássica, que relata o suposto flagrante de Rui Barbosa num ladrão de galinhas da vida (no caso, de patos). Repassando uns arquivos, retirei-a do baú e, só de farra, repasso para vocês. Vejam que delícia.
Certa madrugada o Dr. Ruy Barbosa, tendo flagrado um meliante furtando galinhas em seu quintal, espinafrou o infeliz:
- Ó insignificante bucéfalo! Não é pelo valor intrínseco dos bípedes e palmípedes que te apostrofo – mas pelo ato covarde e sorrateiro com que galgastes, sem permissão, os sagrados umbrais do meu lar! Se o fazes por necessidade ditada pela fome, transijo. Mas se vieste para zombar da prosopopéia de um cidadão digno, ao arrepio do Código Penal, em guarda! Poderás receber formidável pancada de minha bengala no alto do cocoruto, que rachado ao meio ficará reduzido a subnitrato do pó de esterco de pulga, vale dizer, a nada!
- Dotô Rui, o sinhô me perdoe. Posso levar as aves? Balbuciou o estupidificado marginal.
- Permissão concedida, meu sofrido irmão. Antes, porém, degustemos os dois uma chávena de chá inglês em minha biblioteca.”