sexta-feira, 22 de maio de 2009

EXPLORAÇÃO SEXUAL CONTRA CRIANÇAS

Édison Motta
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PORTA ABERTA PARA O CRIME
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PRIMEIRA PARTE
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Pouca gente percebeu, mas durante esta semana diversos órgãos de governo e instituições não governamentais estão realizando eventos para lembrar o Dia contra a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes nacionalmente fixado em 18 de maio. As tímidas manifestações encontram frieza e apatia da maioria das pessoas. Algo que parece distante do cotidiano de cada um, mas que, paradoxalmente, coloca em risco a vida de todos no submundo de violência e criminalidade em que estamos todos envolvidos.
Infelizmente, no Brasil, são múltiplos e incontáveis os casos de abusos, frequentemente não registrados nas páginas policiais. Nossas precárias estatísticas apontam que a violência é praticada, na maioria das vezes, nas próprias residências envolvendo pais e enteados e até mesmo pais e filhos.
Também nesta semana, o jornal O Globo trouxe matéria ainda mais estarrecedora ao revelar que cerca de 12 mil meninos e meninas de escolas e orfanatos sofreram abusos sexuais de padres e freiras da Igreja Católica da Irlanda. Segundo uma investigação iniciada em 2000 e publicada nesta quarta-feira em Dublin, o governo fez pouco para impedir as violações, que ocorreram entre as décadas de 1930 e 1990. O juiz da Suprema Corte, Sean Ryan, ainda segundo a matéria de O Globo, afirmou que o resultado conta com 2.600 páginas, organizadas pela Comissão para a Investigação de Abusos a Crianças com base em testemunhos de milhares de ex-alunos e funcionários das cerca de 250 instituições dirigidas pela Igreja. Quase todas elas foram fechadas nos anos 80 e 90. No entanto, houve casos de abusos, em menor escala, registrados até o ano 2000. Há relatos de crimes até mesmo em hospitais para crianças com necessidades especiais. Mais de 30 mil crianças acusadas de roubo, abandono de escola e filhas de mães solteiras foram enviadas para a sombria rede de escolas técnicas, reformatórios, asilos e orfanatos católicos por cerca de 60 anos. "As escolas eram administradas de forma severa, impondo uma disciplina opressiva e não razoável às crianças e funcionários", diz o documento.
O relatório concluiu que os líderes da Igreja sabiam sobre os crimes - inclusive sobre os abusos sexuais de meninos, cometidos por padres e funcionários -, mas acobertaram de forma sistemática a prática. Ainda assim, o documento não aponta responsabilidades nem recomenda abertura de processos.
Os abusos sexuais eram "endêmicos" dentro das instituições para rapazes, dirigidas principalmente pela ordem dos Irmãos de Cristo. As meninas eram subjugadas principalmente pela ordem das Irmãs da Misericórdia, que as humilhavam e as faziam se sentir desprezíveis.
A Igreja Católica tentou repetidamente impedir a publicação do relatório elaborado por uma comissão independente irlandesa, que ouviu os depoimentos de milhares de pessoas, atualmente com idades entre 50 e 70 anos.
"Em algumas escolas os rituais aconteciam rotineiramente. As meninas eram golpeadas em todas as partes do corpo com objetos desenvolvidos para provocar o máximo de dor", informa o relatório.
Há muito tempo as vítimas do sistema exigem que suas experiências sejam documentadas e publicadas para que as crianças irlandesas não voltem a padecer com os mesmos sofrimentos. No entanto, a maioria dos líderes das ordens religiosas nega as denúncias, afirmando que as declarações são exageradas e mentirosas.
Dia desses, nosso considerado amigo e colaborador deste blog Oswaldo Lavrado lançou um desafio geral para que alguém se habilitasse escrever sobre Adão e Eva. O Edward de Souza, matreiro, pulou fora. Diz serem impublicáveis seus pensamentos sobre o assunto. Tentam marginalizar o padre, freqüente leitor e comentarista, ato que não compartilho. Creio seja importante trazer o padre para comentar o que pensa sobre a “santa” Igreja Católica Apostólica Romana em cujas instituições “educacionais” proliferaram casos de abusos como estes relatados sobre os reformatórios religiosos da Irlanda.
Ficamos com a nítida sensação de que estamos todos, como sociedade, no foco errado: a pregação dos púlpitos a respeito do Paraíso, do Jardim do Éden, Adão e Eva, pecado e salvação encontra pouca ressonância junto à realidade praticada nos escuros corredores dos colégios correcionais mantidos sob a fachada da misericórdia e do amor ao próximo. Em nosso país, não alcança a favela, os cortiços e os rincões das periferias dos grandes centros urbanos onde predomina a lei do cão sob o manto do tráfico de drogas. Vivemos como o avestruz, com a cabeça enterrada na areia.
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No capítulo final de amanhã, você vai saber que a violência praticada contra menores é apenas a ponta de um imenso iceberg da explosão demográfica em nosso território, alimentada com o bolsa-familia de um lado, e com a frenética construção de presídios na outra ponta.
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*Édison Motta, jornalista e publicitário é formado pela primeira turma de comunicação da Universidade Metodista. Foi repórter e redator da Folha de S.Paulo e Jornal do Brasil; editor-assistente do Estadão; repórter, chefe de reportagem, editor de geral (Sete Cidades) e editor-chefe do Diário do Grande ABC. Conquistou, com Ademir Médici o Prêmio Esso Regional de Jornalismo de 1976 com a série “Grande ABC, a metamorfose da industrialização”. Conquistou também o Prêmio Lions Nacional de Jornalismo e dois prêmios São Bernardo de Jornalismo, esses últimos com a parceria de Ademir Médici, Iara Heger e Alzira Rodrigues. Foi também assessor de comunicação social de dois ministérios: Ciência e Tecnologia e da Cultura. Atualmente dirige sua empresa Thomas Édison Comunicação. _____________________________________________________