domingo, 15 de março de 2009

AS HISTÓRIAS DAS REDAÇÕES DE JORNAIS

Edward de Souza
PARTE II

O INIMIGO NÚMERO UM DOS FOCAS

Os relatos sobre os velhos tempos das redações de jornais trouxeram a esse blog a visita de velhos e bons amigos jornalistas, todos com histórias engraçadas pra contar. Nesse final de semana recebi um e-mail de Oswaldo Lavrado, querido amigo e companheiro de muitas lutas em jornais e emissoras de rádio, comentando o primeiro artigo dessa série e recordando-se, saudoso, do velho João Colovatti, o inimigo número um dos focas que chegavam ao jornal. Colovatti "batizava" todos eles (as). Em sua narrativa, Lavrado volta aos anos 70 e recorda-se da antiga redação do Diário do Grande ABC, antes da construção de seu magnífico edifício. Era apenas uma casa e abrigava ali todos os extraordinários profissionais daquele tempo. Nos fundos, o laboratório fotográfico dominado pelo terrível João Colovatti, um dos melhores profissionais que tive oportunidade de conhecer. Lavrado, no começo dessa década era mais um dos focas - principiante no jornalismo – e foi também outra vítima de João Colovatti. Oswaldo Lavrado narra o acontecido, acompanhem. Hilariante!
Entediado nesta tarde de sábado de sol e chuva aqui em São Bernardo e na solidão que envolve um velho em seu apartamento, encontrei momentos de recordações ao ler em seu blog a história dos velhos e bons tempos do Diário, nos anos 70, e dos inesquecíveis João Colovatti e Zé Barbosa. O pássaro preto, personagem central da matéria, claro, tive o prazer de conhecer. Por ter convivido com os três (Edward, Colovatti e Barbosa) me transportei para o local dos fatos relatados e veio à mente a fisionomia debochada do João, com seu rosto "bolachudo", sua careca reluzente e seu olhar muitas vezes de menino. Também fui vítima do bonachão quando entrei no Diário, em 71. No começo nunca havia carro, motorista ou fotógrafo aos "focas", e eu era um deles. Nem a palavra do todo-poderoso José Louzeiro, então Secretário de Redação, servia de aval pra conseguir demover a turma da velha guarda, que julgava-se dona dos carros do jornal. Com o tempo, no meu caso, como foi no seu, todos se tornaram amigos, companheiros e muito colaboraram para o êxito de algumas de nossas matérias. Lembro-me de certo dia, acho que em 72, quando fui escalado pelo Josué, Editor de Esportes, para cobrir um jogo do Saad contra o Noroeste, em Bauru. O fotógrafo escalado foi o Claudio Polesi, que você conhece bem. Um 0 a 0 daqueles terríveis. Jogo ruim, sem nenhuma graça. Retornamos de Bauru a noite e como o Diário na época não circulava às segundas-feiras fui redigir a matéria para a edição de terça-feira. Tudo bem, não fosse o Colovatti, lá pela uma da tarde, invadir a redação (na casinha, lembra?) e perguntar em voz alta pra todo mundo ouvir: "Lavrado, quantas pessoas morreram lá no campo do Noroeste?". Sem tirar os olhos da "Olivetti" não dei muita bola para o João. Porém, o Daniel Lima, ao lado e com aquela cara de professor aloprado, não deixou barato: "o que foi que houve em Bauru, João?".
- Pô, vocês não sabem, caiu a arquibancada do estádio no final do jogo matando pelo menos 10 pessoas e deixando um punhado de feridos. Ouvi isso ontem a noite na resenha da Rádio Nacional (hoje Globo), disse Colovatti.
O Daniel me fuzilou com os olhos e palavras: "Lavrado, você esteve lá e não viu a tragédia?" Apavorado, peguei os jornais de São Paulo que estavam na redação e nenhuma notícia.
- Vai Lavrado, depressa, liga pras rádios e jornais de Bauru e veja o que aconteceu", determinou o Daniel, na ocasião, Editor Chefe. E assim fiz. O João Colovatti havia desaparecido. Saiu de fina depois de provocar o caos na redação. Fiquei a tarde toda tentando falar com alguém de Bauru. Naqueles tempos as ligações eram demoradas e difíceis. Pior. Quando conseguia falar em Bauru, ninguém sabia de tragédia no estádio do Noroeste. Alguns até riam quando ouviam a pergunta. Nenhuma informação sobre a tal queda de arquibancada. Mais tarde, descobriu-se. Tratava-se de mais uma das inúmeras peças pregadas pelo Colovatti nos jovens repórteres. Paguei o mico.
Tem mais histórias para ser contadas. Lembra-se daquele japonês que desapareceu nas matas da serra do mar, acho que em 71? Itiro Mutai, se não me engano. O Diário mandou pra lá o Renato Campos, a Sônia Nabarrete e o Colovati. O trio ficou três dias sem aparecer no jornal dizendo que estava "apurando" o caso. A serra do mar, você sabe, fica a meia hora de carro de Santo André e da redação do jornal. Até hoje não acharam o japonês, nem vivo nem morto. Os três, Renato, Sônia e João, nunca conseguiram explicar direito onde foram procurar o “japa”. As más línguas dizem que nas praias de Santos. Enfim, são histórias reais do tempo do velho e bom Diário. Hoje, apesar do corpo já estar definhando, a memória, felizmente, ainda arquiva os grandes momentos da vida.