quinta-feira, 16 de julho de 2009

BRASILEIRO É MESMO UM CARNEIRINHO?

NIVIA ANDRES
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Reflexões sobre a omissão coletiva
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Acredito, sinceramente, que todos os cidadãos brasileiros dignos e decentes estejam muito insatisfeitos com os desmandos que estão acontecendo na política. Mas o que fazemos para demonstrar contrariedade? Nossa insatisfação é passiva, constrangida, inerte, envergonhada. Rima com omissão. Os políticos perderam todos os limites impostos pela ética, solapam escancaradamente o patrimônio público e devem rir muito dos poucos que se atrevem a denunciá-los. A ousadia e o cinismo dos corruptos é respondida com uma espécie de conivência angelical por aqueles que se julgam "do bem". É a aceitação silenciosa de todos os abusos, expressada na mansidão de um dócil rebanho...
Na verdade, não queremos nos incomodar, porque o protesto, a denúncia, implicam no abandono da tranquilidade da vida privada, significam que teremos de suportar eventuais pressões, ameaças e perigos outros inerentes à iniciativa de mexer com o poder da corrupção secularmente entranhado neste país.
A questão crucial é que, intimamente, todos acreditamos que a situação é insolúvel - a corrupção já faz parte da vida dos brasileiros, entranhada até nos mais recônditos e honoráveis bastiões da vida nacional. Mais, ou menos, todos são corruptores e corrompidos. Depende do interesse que move cada um. O afrouxamento dos valores e a impunidade, de fartos e fortes exemplos diários, contaminaram a quase todos. E os bons modelos não contagiam mais ninguém. Se é muito mais fácil conseguir o que se quer pelo caminho mais curto, por que optar pelo correto, que é tortuoso, demanda tempo e nada garante?
Cada dia traz à luz novo espetáculo da corrupção que grassa nas instâncias de poder mais altas da república, onde se pratica os mais variados trambiques voltados a embolsar o dinheiro público. Mais uma leva de servidores do Estado, governantes, deputados e senadores envolvida no escândalo. Fica muito claro que o exercício da política no Brasil se resume a lances de esperteza, malandragem, compadrio e tráfico de influência.
A grande maioria dos políticos, hoje, não se interessa mais pela responsabilidade que lhes foi imposta pelos eleitores. O poder é apenas a porta de entrada para um mundo mágico onde tudo é possível. Tão possível que agora o fruto da gatunagem viaja em malas, cuecas, caixas de bebida e outros tantos invólucros nada ortodoxos. Sucesso político não mais se traduz em bons projetos, programas e leis que beneficiem a população, mas em iates, helicópteros, carrões importados e mansões. Quanto mais, melhor.
Triste mesmo é constatar que os cidadãos não têm mais instrumentos efetivos para interferir nos procedimentos da política já que abdicaram de exercer, com responsabilidade e senso crítico, o poder de escolha pelo voto. Preferiram, mais uma vez, eleger malandros, delinquentes, aproveitadores, cínicos e espertalhões, que continuam a dilapidar os cofres públicos, sem o mínimo pudor, crentes que a impunidade, mais uma vez, os privilegiará.
Assim, seria absolutamente injusto não mencionar aqui outro importante comparsa da quadrilha: o povo brasileiro que, agora, se queda, como marionete inerte, a assistir o espetáculo proporcionado por brilhantes atores de estrelas reluzentes, numa cena que seria cômica se não fosse trágica. Um país que trata com seriedade suas questões políticas jamais reconduziria notórios corruptos e corruptores a cargos eletivos. O povo compactuou com a esparrela, sim. Continuou a validar e aplaudir quem o ludibriou. Mas, e aqueles brasileiros que ainda acham que vale a pena lutar, têm coragem e ainda conhecem o significado da palavra vergonha, o que podem fazer? Estes têm que gritar, exigir seriedade e decência, pois a democracia não sobrevive sem a devida responsabilização dos agentes públicos. Nós temos o ônus de cobrá-la. Podemos até pensar em mudar, mas isso não significa que a situação vai melhorar, a menos que haja uma reforma democratizante da política, que só vai se concretizar se houver pressão da sociedade e uma quantidade suficiente de inovações que instituam regras para resgatar a política do buraco profundo em que se meteu. Com as regras que estão aí o jogo não muda.
Chegamos a uma situação-limite da vida política brasileira: ou reagimos e fazemos valer as regras do sistema democrático-constitucional ou vamos ser dizimados por um movimento político de dominação definitiva da coisa pública para fins privados e partidários. Se conservarmos a atitude cordata, apática, será tarde para lutarmos pelos direitos inarredáveis da liberdade e até ela, a liberdade, já vai nos ter sido roubada.
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*Nivia Andres,
jornalista, graduada em Comunicação Social e Letras pela UFSM, especialista em Educação Política. Atuou, por muitos anos, na gestão de empresa familiar, na área de comércio. De 1993 a 1996 foi chefe de gabinete do Prefeito de Santiago, Rio Grande do Sul. Especificamente, na área de comunicação, como Assessora de Comunicação na Prefeitura Municipal, na Associação Comercial, Industrial e de Serviços (ACIS), no Centro Empresarial de Santiago (CES) e na Felice Automóveis. Na área de jornalismo impresso atuou no jornal Folha Regional (2001-06) e, mais recentemente, na Folha de Santiago, até março de 2008.
http://niviaandres.blogspot.com/
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