sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

QUINTA-FEIRA, 9 DE DEZEMBRO DE 2010


Nunca, em tempo algum, o sistema de saúde brasileiro esteve tão debilitado como agora. Os recentes casos, mostrados ao mundo via Imprensa, chocam, revoltam e desacreditam as instituições e as pessoas ligadas ao setor. É verdade que a ciência médica tem evoluído nos últimos anos. Também não é falso que novas doenças surgem e a medicina engatinha no encontro de tratamentos que possam curar ou radicar de vez males modernos, mas não se pode negar que erros clínicos vêm aumentando cada vez mais, causando uma grande preocupação em toda a sociedade.

O caso mais recente da incúria médica e que abala a opinião, menos ou mais esclarecida, é o da menina Stephanie dos Santos Teixeira (foto), (12 anos), aqui de São Paulo, vítima fatal da inabilidade de uma atendente de enfermagem, que inadvertidamente, trocou um frasco de soro por outro de vaselina líquida. A desatenção ou inabilidade da funcionária foi fatal para a garota, sua família e, não fosse este país, o Brasil, poderia ser irreversível aos causadores do trágico engano. A menina Stephanie iria completar 13 anos em janeiro e tinha duas irmãs.
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Stephanie chegou ao hospital apresentando vômito e diarréia. Na ala de pediatria infantil, a paciente foi medicada na veia com 50 ml de vaselina, que após oito horas de aplicação causou sua morte. A menina começou a passar mal na terceira bolsa da substância aplicada. Especialistas em toxicologia dizem que a vaselina líquida não se mistura no sangue. No corpo humano, causa obstrução ou entupimento de várias veias e artérias. Levando-se em conta que a negligência ocorreu no hospital São Luiz Gonzaga (foto), no Jaçanã, zona norte, tradicional estabelecimento de saúde, terceirizado para a Santa Casa de São Paulo, a maior cidade brasileira e uma das mais pujantes do planeta, a repercussão foi imediata. O caso mobilizou vários setores nacionais, especialmente a mídia festiva, ávida em assuntos dessa natureza. A área de Saúde Pública da Promotoria de Direitos Humanos da capital instaurou um inquérito civil para apurar denúncias de mau atendimento e de falta de funcionários.

O caso da menina também não é o único a ser questionado. Desde 2003, pelo menos 10 famílias acusaram o hospital de erros médicos às autoridades policiais. Todos sem morte. O despreparo que atinge grande parte do pessoal que trabalha ou presta serviços em hospitais, públicos ou privados, salta aos olhos e, invariavelmente, provoca mortes e desestruturação de famílias. Nesta quarta-feira, o ministro da Educação, Fernando Haddad (foto), admitiu que as instituições que preparam enfermeiras e atendentes hospitalares necessitam urgente de reciclagem.

Decisão tardia para muitos pacientes, que sucumbiram diante da inabilidade de quem deveria estar preparado para cuidar e salvar vidas. Já o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, arranca os cabelos tentando encontrar solução mais eficiente no atendimento e tratamento ao paciente. Os problemas são muitos, deste o atendimento adequado, o tempo de marcação de consultas, as instalações hospitalares e, principalmente, a competência e sensibilidade humana. Por ter em suas mãos o futuro do paciente, boa parte da classe médica desdenha sua função por entender ser superior ao cidadão que está na maca ou mesa de operação.

Faz dois anos que sou visita frequente de hospitais, UBS, Pronto Socorro, clínicas e centros de saúde, públicos e particulares, alguns de referência nacional. Não foi necessário muito esforço para detectar a ineficiência das instituições médicas brasileiras. Tenho observado, in loco, as instalações hospitalares menos dignas do que pocilgas, médicos (as) absortos enquanto atendem pacientes, enfermeiros (as) em bate papo de “candinhas de cortiço” enquanto aplicam curativos, atendentes que encaram o doente como se este fosse o monstro do lago Ness, além de truculentos seguranças, que se julgam "otoridades" hospitalares. Isso, em casas de saúde aqui no ABC, composto por cidades tidas como pujantes, ricas e atualizadas. Imaginemos, pois, o que acontece em regiões mais afastadas e menos aquinhoadas de progresso.

O caso de Stephanie dos Santos, ocorrido na capital paulista, de imediato chamou a atenção da Imprensa e, por consequência, do Brasil. Ministros, governadores, deputados, prefeitos e vereadores deitam falação via Embratel, exigindo providências imediatas, sem atinar, por dolo ou conveniência, que a solução está dormitando em suas mãos e cabeças. Um despropósito com a chancela tupiniquim. Stephanie foi apenas mais uma vítima da incúria nacional em relação à saúde. Certamente nos fundões do Estado de São Paulo, nos rincões das fronteiras brasileiras e nas caatingas do sertão, acima e abaixo da linha do equador, muitas tantas “Stephanies” estão sepultas em virtude da banalização do sistema de saúde e da insensibilidade de grande parte de uma classe, cuja função, após juramento solene, é salvar vidas humanas. Nesta sublime missão, data vênia, a Providência Divina caminha sozinha.
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*Oswaldo Lavrado é jornalista e radialista, radicado no Grande ABC.
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