terça-feira, 26 de maio de 2009

SUFOCO PARA TRANSMITIR UM JOGO DE FUTEBOL NO ESTÁDIO DO FLUMINENSE

O AMIGO HUGO CARVANA
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OSWALDO LAVRADO
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Começo dos anos 90 e a Rádio Diário do Grande ABC acompanhava os jogos do Santos no Brasileirão. Como os times aqui do ABC - Santo André, São Bernardo e São Caetano - estavam sem atividades, a equipe de esportes da Rádio Diário transmitia as partidas do “Peixe” em qualquer lugar do Brasil. Um belo domingo de fevereiro de 1991, o Santos enfrentaria o Fluminense, no Estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Trocamos o conforto da viagem de 45 minutos de avião entre São Paulo e Rio e embarcamos de carro encarando seis horas de viagem pela Via Dutra num já rodado Gol do Diário. Aboletados na lata de sardinhas, eu, o Edward, o Maurício Muniz (operador de som) e o motorista preferido da equipe, José Moraes, o "Lampião". A viagem foi tranquila, apesar dos vacilos do Lampião, cuja visão e golpe de vista ao volante deixavam qualquer um com o coração na mão, especialmente em longos percursos. Batemos no campo do Fluminense por volta das 13h e nos dirigimos à cabine de imprensa, onde deveria estar à nossa disposição uma linha telefônica para a devida transmissão do jogo. Deveria, mas não estava. Era o começo de mais um drama.
No estádio havia uma equipe da Telerj - Telefônica do Rio de Janeiro - para dar assistência às rádios. Não encontrando nossa linha, me dirigi a um funcionário da Telerj solicitando ajuda para entrar em contato com nossa rádio, no ABC. O rapaz, demonstrando não estar muito disposto a resolver nosso problema, consultou uma lista e decretou: "acho que vocês não vão transmitir nada aqui. Acontece que são muitas emissoras de rádio de várias localidades do Brasil e não há linha para todas. Algumas foram cortadas e a Rádio Diário é uma delas". Fiquei lívido com a explicação do rapaz da Telerj. Fui ao chefe dele e mostrei um documento comprovando que a Diário havia reservado a linha com antecedência e alguém da Telerj teria que dar uma solução. Sem transmissão nossos empregos estavam a perigo, principalmente o meu, então chefe da equipe de esportes da rádio. Acompanhando o Santos, a Diário tinha alcançado excelente audiência em toda a Grande São Paulo. Por essa razão, nosso compromisso era enorme com a direção da empresa, patrocinadores e principalmente o ouvinte. A credibilidade da rádio e nosso emprego estavam em jogo.
Enquanto eu espinafrava o cara da Telerj, o Edward desceu das cabines e foi para lanchonete do estádio pra não ver a discussão entre eu e o rapaz da Telerj. Em pé, encostado no balcão da lanchonete, saboreando uma cerveja, estava o ator e diretor global Hugo Carvana, torcedor fanático do Fluminense. Nem saberia explicar direito o que aconteceu, mas Edward e Carvana ficaram amigos, uma amizade que nasceu em segundos. Eu percebia da cabine de rádio, enquanto brigava pela linha com a Telerj, que ambos conversavam como velhos conhecidos.
Preocupado com a transmissão e também comigo que estava a ponto de explodir com o rapaz da Telerj, Edward expôs o drama ao paciente Hugo Carvana - mais tarde soubemos, o ator tinha um cargo na direção do Fluminense. Carvana se propôs a dar uma mão, mas não sabia como. Afinal se todas as linhas existentes no estádio estavam ocupadas pelas inúmeras emissoras, o que fazer?
Então, se fez a luz. O Edward, assessorado pelo Hugo Carvana, foram procurar o chefe da Telerj e, os três, solucionaram a pendenga. O diálogo que os dois "atores" tiveram com o homem da telefônica carioca foi mágico." Veja ai o que o senhor pode fazer. O rapaz (Lavrado) está nervoso porque a gente pode ser demitido se esta transmissão não sair. Dá uma forcinha", implorou o Edward, enquanto o Carvana dava um tapinha nas costas do funcionário da Telerj e ao mesmo tempo atendia uma jovem linda, cabelos longos e bronzeada, que estava em busca de autógrafos.
Muito mais pela presença do Hugo Carvana do que pela súplica do Edward, o chefe da telefônica carioca respondeu: "vamos ver, vamos ver". O tempo passava rápido e se aproximava a hora da rádio entrar no ar. Alguns minutos depois o homem sobe para as cabines e berra:" Sêo Lavrado, pode tentar contato com sua rádio no ABC, a linha está liberada".
O expediente que o chefe da Telerj utilizou para arrumar uma linha não vai ao caso e nem importa. Transmitimos o jogo, cumprimos nosso trabalho, agradecemos Hugo Carvana, o mais recente amigo do Edward e nosso também, que continuava encostado no balcão do boteco de madeira do estádio tomando sua Antarctica e retornamos a São Paulo, não sem antes passar por outros sufocos no caminho de volta, nas mãos do nosso querido motorista “Lampião”. Mas essa parte fica para outra oportunidade.
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*Oswaldo Lavrado - jornalista e radialista - trabalhou no Diário do Grande ABC, rádio e jornal, e comandou a equipe de esportes da Rádio Diário. Atualmente é editor do semanário Folha do ABC.
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