domingo, 19 de setembro de 2010

ESTAMOS CRIANDO ÍDOLOS DE BARRO?

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SÁBADO, 18 DE SETEMBRO DE 2010

O REIZINHO ESTÁ NU

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Poucos são os jovens, hoje, que desfrutam de prestígio, respeito, consideração, equilíbrio, fama e grana, conquistados com pouco ou quase nenhum esforço. O talento, herdado da providência, resolve tudo, ou quase tudo. Nos dias atuais, mais que quaisquer outros, estão nessa raia o garoto mato-grossense Luan Santana, 19 anos, cantor popular, e Neymar (18 anos), das praias paulistas, que, como poucos, faz da bola instrumento extremamente obediente.
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O primeiro, data vênia, cumpre o ritual de astro famoso e rico comparecendo religiosamente a seus shows e outros tantos compromissos. Pelo visto, Luan é centrado, bem criado, de família regrada e bem sucedido. Apenas segue ensinamentos herdados dos pais e caminha célere para garantir seu sucesso, sem grandes riscos. Neymar, por sua vez, tropeça na vida turbulenta do mundo da bola, que exige malabarismo em campo e fora dele. Um neófito ofuscado pelas luzes que embaça a conduta dos que não estão devidamente preparados. Nascido de família humilde e sem muitos recursos para a criação, o menino prodígio está agora enfrentado os brucutus do cotidiano. Imberbe, Neymar não está suportando a carga imposta pela fama e riqueza que lhe caem nos ombros.
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O fardo lhe parece pesado, mas seus olhos estão em outro horizonte. Até pouco tempo a vida não permitia à sua família, a ele e seus irmãos, luxos de gente mais abastada; uma bola usada e um par de chuteiras de segunda mão, mesmo apertando os pés, bastava para o sorriso do menino luzir como estrelas. O dinheiro para o ônibus, quando havia, era rigorosamente contado, que não permitia o cobiçado sorvete no retorno. Voltando a pé, economizava para o picolé. Quando menos se esperava, na cronologia do tempo, Neymar via nas manchetes esportivas que valia milhões de euros. "Quem? Eu?", questionava, sem entender bem. A família, igualmente, não atinava com a realidade e passou a acreditar que no filho malabarista da bola estava o baú para a emancipação definitiva e o apagão dos tempos de pés no chão e panelas quase vazias.
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Assim, rápido como raio, surgiu o novo Rei do esporte das multidões que passou a ser paparicado, como todo aprendiz de Majestade tem direito. Deslumbrado, o menino-rei não tem dado conta do labirinto em que está e qual o caminho que deve seguir para não derrapar nos obstáculos e impedir o curso normal das coisas. Parece não estar preocupado. As lambanças dos últimos tempos tem lhe custado constrangimentos e pedidos de desculpas, evitáveis se tivesse orientação familiar e dos superiores no clube. No entanto, ambos paparicam o garoto sugerindo que pais e cartolas estão mais interessados no que o menino possa lhes render financeiramente.
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Carente de pessoas que possam lhe indicar o trilho do porvir grandioso, Neymar prossegue chutando a bola e tudo que aparece à frente para controlar seu estrelismo. Esquece, por exemplo, que Robinho, seu companheiro de bola e igualmente oriundo de casebres que cercam as praias, passou, a algum tempo, dias de dor e desespero por expor ostentação e opulência, chamariz para os mal intencionados. O caso (sem entrar no mérito), Bruno, do Flamengo, ainda está quente o suficiente para queimar as mãos de quem insiste em achar que tudo pode.
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Enquanto o também menino Luan Santana, aqui comparado, encontra nas melhores mãos e cabeças (família e empresário) estrutura para conduzir seus passos a horizontes sólidos, sem ter que se curvar a hipocrisias, Neymar, na contramão, não vê, em casa e no clube, braços e cabeças que possam indicar o caminho menos perigoso para um porto seguro e confiável. Neymar, o reizinho, ainda está desnudo; Luan, um príncipe centrado a caminho do sol. Destinos iguais que somente o tempo poderá se encarregar de fornecer o instrumento certo para alavancar a longa trilha que leva ao sucesso definitivo. Histórias de êxitos (poucos) e fracassos (muitos) contam a sina dos que não foram ofuscados pelos holofotes e dos que sequer viram as luzes que poderiam fazê-los brilhar.
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Um adágio chinês já alertava: o importante não é ser o melhor, é permanecer no topo, com humildade, muita humildade.
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*Oswaldo Lavrado é radialista/jornalista radicado no Grande ABC
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