sábado, 3 de outubro de 2009

MILTON SALDANHA E OSWALDO LAVRADO ESCREVEM SOBRE AS OLIMPÍADAS NO RIO

Copa e Olimpíada devolvem o
pão e circo à Ilha da Fantasia

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Certamente o assunto em pauta no Brasil no momento é a escolha do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos de 2016. Faltam, portanto, pouco mais de sete anos para a realização, aqui em nosso território, da maior e mais pujante competição esportiva do planeta. Vencemos com galhardia americanos, japoneses e espanhóis, num pleito cujas cartas adrede marcadas enchem de orgulho o povo brasileiro. O Rio de Janeiro, literalmente, parou para aglomerar milhares de cariocas na praia de Copacabana que, ao compasso de um show musical, dançou ao melhor estilo tupi-guarani, sem atinar direito para a insensatez do compromisso assumido. Na mais pura demonstração que privilegia a emoção em detrimento da razão, o presidente, alheio ao buraco em que meteu o País, derramou lágrimas inerentes a uma criança que ganha sua primeira bola oficial. Ao lado dele, figuras ilustres da política e do esporte nacional. Todos se abraçavam como se tivessem, em conjunto, abiscoitado substancial bolada na loteria brasileira. Por tabela, a coisa caminha nessa direção. Faltam pouco mais de 2.555 dias para a festa brasileira, inédita na América do Sul. Antes, em 2014, haverá uma Copa do Mundo de futebol, competição esportiva igual ou mais suntuosa que as olimpíadas da Era Moderna. Enumerar os gastos com os dois mega-projetos seria praticar de forma utópica o exercício da numerologia, ao mesmo tempo que indicar os programas mais urgentes à população, onde a verba poderia e deveria ser aplicada. O Brasil de agora, especialmente o Rio de Janeiro, tropeça nas necessidades cotidianas fartamente divulgadas pela Imprensa nacional. No caso da Cidade Maravilhosa, salta aos olhos os desmandos, a corrupção, a violência e o timão da cidade nas mãos de traficantes que comandam um governo paralelo mais poderoso e organizado do que o legalmente constituído.
Pior do que as necessidades urgentes é a conduta duvidosa dos nossos comandantes, a maioria inebriada com algumas conquistas naturais que enchem de soberba o presidente falastrão. O escândalo do Senado, o desvio de verbas do PAC, a baciada de novos vereadores, a prisão de alguns políticos do Interior do País por corrupção e mais um sem número de maracutaias ficam camufladas na enganosa vitória brasileira sobre americanos, japoneses e espanhóis.
A fauna estelionatária tupiniquim, que esfrega as mãos com a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, (que não possui sequer um estádio em condições de sediar a competição), sente cair no colo uma mina ouro puro, já lapidado. Afinal, construir estádios e toda uma infra-estrutura para uma copa e uma olimpíada exige vultosos investimentos cujos cofres, claro, são os bolsos dos contribuintes. Os arautos da fanfarronice, os abutres de plantão, os políticos, grande parte da imprensa ufanista e, por tabela, substancial parcela da população brasileira estão radiantes. Abriram os currais da Ilha da Fantasia e a festança está prestes a começar, afinal serão sete anos, entre a Copa e os Jogos Olímpicos, da farra do boi, onde os poderosos, argolados no poder, entram com os chifres e o povo com o traseiro. Dopado com a ingestão de constantes trapaças, o brasileiro inerte ao que acontece em seu redor, não mais se dá conta da realidade e, ao contrário de se indignar, observa passivo as travessuras do desastrado comando. No melhor estilo relaxa e goza, o povão vai digerindo a malandragem. Deus, parece, já não é tão verde e amarelo. Porém, o que importa no momento é que o Rio de Janeiro está em festa e, agora, mais maravilhoso e lindo do que nunca.

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OLIMPÍADAS, A ROLETA DO LULA
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Para quem está extasiado com essa irresponsabilidade do governo brasileiro de trazer as Olimpíadas para cá em 2016, brincadeira já estimada em cerca de 30 bilhões, ou mais, vou fazer uma pergunta: vocês sabem de quanto é o orçamento da cidade São Paulo, a maior da América do Sul, para o exercício de 2009? Isso saiu nos jornais, mas certamente a maioria não saberá responder. Vou ajudá-los, sugerindo reflexão sobre esses números. O orçamento paulistano é de exatamente R$ 29.394.457.152,00. Ou, em números redondos e simplificados, R$ 29 bilhões e 400 milhões. Preciso dizer mais? Vamos gastar uma São Paulo num evento de dez ou quinze dias, pretendendo ser uma vitrine para o mundo.
O Brasil deu um salto no escuro quando não retirou com prudência sua candidatura. O presidente poderia ter acionado uma rede nacional de rádio e TV para explicar às pessoas que seria muito lindo ter uma olimpíada aqui, só que o custo disso é tal e tal e somos um país em construção (para ser otimista), com prioridades extremamente mais cruciais, nos mais variados setores. Um país que sequer controla a epidemia de dengue vai fazer um gasto absurdo desses. Um país que deveria investir sim na alfabetização do seu povo, onde mais de 60% da população mal assina o nome.
Ainda na sexta-feira, aqui no blog do Edward de Souza, teve um leitor que respondeu furioso às críticas que de cara fiz à “vitória” do Brasil na Dinamarca. Ele argumentou, não com essas palavras, que com Olimpíada, ou sem Olimpíada, o governo não gastaria esses 30 bilhões na área social. Foi mais ou menos isso.

O que ele não conseguiu perceber é que aqui a questão não é o que o governo hipoteticamente gastaria. A questão é o que em realidade não gastará. Não gastará, repito, ao criar um rombo no orçamento. É claro que terá que fatiar mais uma vez o orçamento, tirando recursos de setores já longamente penalizados, como a educação, cultura, saúde, segurança, habitação, previdência e muitos outros. Investindo essa montanha de dinheiro num evento de retorno questionável e imprevisível, como se o Brasil fosse uma grande roleta de cassino, o governo não gastará exatamente onde deveria gastar, sobretudo quando se fala de educação e saúde, sem esquecer a segurança pública.
Essa aventura do presidente, avalizada por uma parcela expressiva da população e de personalidades famosas que pleitearam o Rio como sede do grande evento mundial, terá um preço totalmente incompatível com nossa realidade. Não somos os Emirados Árabes, onde se queima charuto com folhas de petrodólares. Aqui é o país dos desdentados e dos desesperados, muitos deles transformados em facínoras por desespero ou ambição doentia, fomentada pelos medíocres valores do capitalismo. Não se poderia fazer uma festa desse custo quando a tragédia do país, em todos os sentidos e dimensões, está ali ao lado. A começar, literalmente, pela favela da Rocinha, que certamente vão esconder com tapumes gigantescos.
Tudo isso porque a “vitória” na Dinamarca se insere num projeto de permanência do lulismo no poder a qualquer custo, mesmo que para isso seja preciso arrebentar o país. Não há limites!
Em paralelo, estamos comprando os caças para a defesa do país, um investimento que pode até ser polêmico, mas que tem sua lógica e seus argumentos aceitáveis. E vamos bancar uma Copa do Mundo. Somando tudo, noves fora a roubalheira, que até meu gatinho sabe que acontecerá, como ficará este pobre Brasil nos próximos anos?
E para finalizar, como iniciei com números orçamentários, não custa nada recapitular de quanto é o orçamento da cidade do Rio de Janeiro, que sediará a Olimpíada: não chega a 11 bilhões de reais. Ou seja, a irresponsabilidade daria para financiar a cidade durante três anos.