quarta-feira, 27 de maio de 2009

O DIA EM QUE EU SUMI COM O GOVERNADOR

Aconteceu na Feira do Comércio e Indústria de Santiago/RS
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Nivia Andres
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Calma, calminha, não é o que estão pensando, logo explico... Em 2001, eu trabalhava na Associação Comercial, Industrial e de Serviços, como assessora de comunicação. Além das atividades normais de divulgação da entidade, secretariava a diretoria, registrava as reuniões, programava e planejava os eventos, redigia o protocolo, atuava como mestre de cerimônia e tudo o mais que aparecesse. Ainda encontrava tempo para uma coluna semanal no jornal Folha Regional, do qual era editorialista e revisora.
Pois bem, nesse ano, a ACIS também promovia, em parceria com CDL, Sindilojas e Prefeitura, a FECOARTI – Feira do Comércio e Indústria, de periodicidade bienal. Mais uma atribuição. Começamos cedo o planejamento do evento, com um ano de antecedência. Comissão organizadora escolhida fomos para a batalha de captar patrocínios e apoios. Em cidade pequena há dificuldade extrema de levantar recursos, mas as despesas essenciais tinham cobertura do caixa da edição anterior.
Uma das maiores atrações da abertura desses eventos, no interior, é a presença do governador do estado. A feira era em novembro, então convidamos formalmente o governador Olívio Dutra (PT) em março e agendamos audiência para outubro, a fim de assegurar a sua presença. Na data marcada, a comitiva de presidentes das entidades, prefeito e rainhas dirigiu-se a Porto Alegre, a 450 km de Santiago, para cumprir a extensa agenda de visitas de dois dias que culminaria no Palácio Piratini. Todos os compromissos foram cumpridos, mas a concretização da audiência com o governador foi um parto. O pessoal tomou um chá-de-banco federal – era um marca-desmarca, um recebe-não-recebe exasperante que se prolongou por horas, até que a Excelência se dignasse a receber a comitiva santiaguense. Menos mal que extraíram a confirmação do vivente, a duras penas.
Na semana da feira, correria geral. O circo estava sendo armado no complexo esportivo municipal – no ginásio foram colocados os estandes e em área anexa, um lonão servia de praça de alimentação e espaço para shows. Ainda havia, nas dependências externas, o salão do automóvel e parque de diversões. A abertura seria na sexta-feira, feriado. Na quarta caiu uma tempestade que derrubou parte da lona dos shows. Foi um deus-nos-acuda para reconstruir a estrutura. Mas conseguimos. Cena pronta para o evento, na véspera, fui confirmar a presença das autoridades. Tudo certo com prefeitos, vereadores, dirigentes empresariais, deputados, padre e bispo, menos com governador. Nada. Em cima do laço, após dezenas de ligações telefônicas, o gabinete me mandou um fax - o governador não viria; o impeditivo era “um compromisso de última hora, inadiável”... Mandaria, a representá-lo, o secretário de ciência e tecnologia. Foi uma decepção. Mas, fazer o quê? Fui organizar o protocolo.
O dia da inauguração da FECOARTI amanheceu majestoso. Céu de brigadeiro, cenário perfeito. Uma hora antes da cerimônia começaram a chegar os convidados, que recebemos em sala especial. Para que pudesse confirmar a presença das autoridades e nomeá-las, hierarquicamente, no protocolo, passei a tarefa de mestre de cerimônia ao colega Carlos Alvim, radialista, advogado e diretor jurídico da ACIS, mais conhecido como “voz de seda javanesa”.
Como sempre ocorre, na última hora, muitos convidados ilustres não estavam presentes. Profissional exemplar, fui ao computador, apaguei o nome dos ausentes e tirei nova cópia do roteiro. Cerimônia iniciada, foguetório, hino nacional, discursos, aplausos, flashes, mais aplausos, foi anunciada a manifestação derradeira – a do prefeito, maior autoridade presente. Hino rio-grandense. Final do evento, a multidão dirigiu-se ao interior do ginásio, para o corte da fita inaugural. Voltei à sala das autoridades, cansada, porém contente com os resultados e detectei certo clima hostil. Burburinho, meias-palavras e o séquito da representação do governador em altos brados. O motivo? Eu havia apagado o secretário de ciência e tecnologia da lista dos discursos... Explicações daqui e dali, eu e o Carlos Alvim fomos submetidos a julgamento sumário pela turma do PT. O crime? Sumimos com o governador, ou melhor, com o seu representante... Incidente político instalado. Em seguida, a turma do abafa entrou e os ânimos serenaram.
Naquela noite voltei para casa muito chateada. Cometi um erro, involuntário, mas que havia causado um frenesi nos manos das causas populares. No dia seguinte, acordei e, ao pegar o jornal Zero Hora, de Porto Alegre, para ler, comecei a rir incontrolavelmente. A foto da capa significava a minha absolvição. Estava explicado o tal compromisso inadiável do governador e motivo de sua ausência na abertura da FECOARTI – uma foto colorida, enorme, mostrava o governante, segurando uma bandeira vermelha, sorridente, no jogo do Internacional...
Mas bah... Que vingança, tchê!
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Nivia Andres, jornalista, graduada em Comunicação Social e Letras pela UFSM, especialista em Educação Política. Atuou, por muitos anos, na gestão de empresa familiar, na área de comércio. De 1993 a 1996 foi chefe de gabinete do Prefeito de Santiago, Rio Grande do Sul. Especificamente, na área de comunicação, como Assessora de Comunicação na Prefeitura Municipal, na Associação Comercial, Industrial e de Serviços (ACIS), no Centro Empresarial de Santiago (CES) e na Felice Automóveis. Na área de jornalismo impresso atuou no jornal Folha Regional (2001-06) e, mais recentemente, na Folha de Santiago, até março de 2008.
Blog da jornalista: http://niviaandres.blogspot.com/
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