quinta-feira, 8 de abril de 2010



RÁDIO - PAIXÃO,

ROMANTISMO & REALIDADE (4)


Na semana que passou, durante os comentários ao capítulo III, um assunto parece ter mexido com o interesse daqueles que valorizam nosso espaço. Muitos, mais jovens, com a curiosidade de conhecer, outros com a vontade de relembrar e aclarar pontos palpitantes de ocorrências que marcaram a época.

Tendo vivenciado a fase áurea da Emissora Continental do Rio, no início da década de 1950, é natural e obrigatório que tenha circulado pelo palco de muitas histórias. O crime do Sacopã, do Citroen Negro, ou da Lagoa, envolveu muita gente, no entanto, três nomes foram o maior destaque: um oficial da aeronáutica, (tenente Bandeira), suposto assassino. Considerada pivô da tragédia, (Marina). Na qualidade de vítima, um funcionário do Banco do Brasil, casado e separado, bastante conhecido galanteador na zona sul carioca, ocupava-se em conquista de mulheres e vida noturna (Afrânio Arsênio de Lemos).

Não vejo necessidade de maiores detalhes sobre o discutido crime ocorrido em 1952, haja vista a riqueza de informação existente na internet mostrando, foco da larga controvérsia, falso testemunho, interesse em ocultar nomes evidentes na política e na sociedade.

Era prefeito do Rio João Carlos Vital; senador Alencastro Guimarães homem de alta importância no cenário político do Brasil, foi ministro em várias pastas da república e tinha alto poder de mando na Central do Brasil, onde foi seu presidente a partir de 1945. Um triângulo amoroso à época ligou as duas famílias a Afrânio. Assumiu a defesa de Bandeira uma das maiores estrelas do direito brasileiro, Romeiro Neto. Depois de condenado a sete anos de reclusão, por empenho do polêmico deputado Tenório Cavalcanti (D), é conseguida revisão processual, sua anulação e apontamento como autor um nordestino vivendo no estado paulista, sob proteção de diretores da Central do Brasil.

Acompanhei o caso pela emissora Continental em alternância com Newton de Souza, repórter que comigo dividia o setor de polícia. Tivemos relacionamento com o delegado Hermes Machado, encarregado do caso Sacopã, de maneira direta, na delegacia de Vigilância e Captura. Era chefe de Polícia do Distrito Federal, na ocasião, o general Moraes Âncora que deixou o cargo logo após o atentado contra Lacerda, na Rua Toneleros, em solidariedade a Vargas, antes de sua morte, no Catete. Âncora e Góis Monteiro foram dos poucos militares leais a Vargas até o momento final. Eu estava lá.
Noventa e três anos de idade, longevidade nunca vista como regente de uma orquestra (68), fazendo o Brasil dançar, cantar, despertar paixões nos ritmos mais variados, concebidos pelo maior arranjador brasileiro: Severino Araújo com sua magistral Orquestra Tabajara. Essa é uma história rica, da música, do rádio, de artistas e de uma grande saudade, que esta série não poderia omitir.

Nos dias 6 e 7 de março que passaram, no Canecão, grande show da Orquestra Tabajara e Peri Ribeiro - encontrei Carlos Coraúcci, autor do livro lançado no último dezembro, pela Companhia Editora Nacional, para contar, “A Vida Musical da Eterna Big Band Brasileira”, ORQUESTRA TABAJARA, DE SEVERINO ARAÚJO (E). Trata-se de luminoso trabalho literário, marcando nossa história e tradição da música orquestrada. Minha aproximação com Coraúcci resgata alegria de um tempo vivido com seu tio William Salomão, narrador de jogos de futebol, acadêmico de direito em Niterói, mais tarde professor de direito. Carlos Coraúcci nasceu em Franca, ama sua cidade e dignamente a representa no meio cultural brasileiro, por assumir a arte de bom biógrafo. Autor de outras obras com olhos no rádio, na TV e no cinema, é bom depositário de saudade que recomendo.

Participando na última semana de um programa de entrevistas no canal 9, de Franca, a Nova TV, o tradicional radialista Valdes Rodrigues, ainda ativo no rádio, emprestando brilho e seriedade também à televisão, inquiriu-me sobre o chamado tortuoso caso do fechamento de emissoras na década de 70, pelos militares.

Tendo vivido no palco das cenas de tal espetáculo, na época intitulada perempção, uma das peremptas me tinha como seu diretor em seu momento finito. Era a tradicional emissora da novela por onde passou com sucesso Ariovaldo Pires, (1934) se não sabem quem foi eu lhes digo: “Capitão Furtado”: Rádio São Paulo S/A, PRA5. Ouço tantas acusações ao chamado governo militar, não quero aqui discutir a opinião de ninguém, no entanto, me inclina supor necessária análise para aplaudir ou apupar. Não penso que tenha sido tortuoso e tampouco artimanha dos militares no poder, como soer propala-se, toda maldade ser-lhe debitada. Os serviços de radiodifusão no Brasil até dezembro de 1962, tinham como gestores, pelo poder concedente, o Departamento dos Correios por sua vez, subalterno do Ministério de Viação e Obras Públicas. Naquele ano o Presidente da República, João Goulart, sancionou a Lei n° 4.117, criando o Conselho Nacional de Telecomunicações, com as disciplinas definidas para o setor.

Em fevereiro de 1967 foi criado o Ministério das Comunicações, órgão que passou a gerir o sistema, no país. No campo radiodifusão, o novo organismo administra desde licitações das concessões de emissoras de rádio e televisão, até o seu funcionamento, em obediência à legislação existente. No mesmo mês de fevereiro, o Decreto n° 236/67 foi editado para complementar a Lei 4.117, ocorrendo várias alterações, entre elas, como rezam os artigos abaixo:

Art. 67. A perempção da concessão ou autorização será declarada pelo Presidente da República, precedendo parecer do Conselho Nacional de Telecomunicações, se a concessionária ou permissionária decair do direito à renovação.

Parágrafo único. O direito à renovação decorre do cumprimento pela empresa, de seu contrato de concessão ou permissão, das exigências legais e regulamentares, bem como das finalidades educacionais, culturais e morais a que se obrigou, e de persistirem a possibilidade técnica e o interesse público em sua existência.

Art. 69. A declaração da perempção ou da caducidade, quando viciada por ilegalidade, abuso do poder ou pela desconformidade com os fins ou motivos alegados, titulará o prejudicado a postular reparação do seu direito perante o Judiciário.

Ao ser estabelecido o decreto, entre outras medidas, havia objetivo de diminuir o poder das redes, limitando o número de emissoras para cada grupo, o que não ocorreu dentro do prazo concedido. Os prazos contratados de concessões e permissões eram de dez anos, quando se deveria buscar a renovação dentro da adequação já imposta pelo decreto. Além do prazo fixado de dois anos para o ajustamento, muitas emissoras só foram peremptas depois de cinco anos (1973). Continua...

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*José Reynaldo Nascimento Falleiros (Garcia Netto), 81, é jornalista, radialista e escritor francano. Autor dos livros Colonialismo Cultural (1975); participação em Vila Franca dos Italianos (2003); Antologia: Os contistas do Jornal Comércio da Franca (2004); Filhos Deste Solo - Medicina & Sacerdócio (2007) e a novíssima coletânea Seleta XXI - Crônicas, Contos e Poesias, recentemente lançada. Cafeicultor e pecuarista, hoje aposentado. A Série Relembranças II será editada em capítulos semanais, às quintas-feiras - uma revisita do profissional de memória privilegiada, à história do Rádio Brasileiro, que se confunde com a sua própria história.
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