sábado, 11 de setembro de 2010

AS POLÊMICAS CADEIRINHAS PARA BEBÊS

SEXTA-FEIRA, 10 DE SETEMBRO DE 2010

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CLASSE POBRE É DESCARTÁVEL

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O recente exemplo que obriga motoristas a usarem em seus carros cadeirinhas para babes e crianças pequenas, lei que passou a vigorar dia primeiro deste mês, mostra claramente que, como sempre, pensaram apenas nos ricos, e que têm apenas um filho. É incrível como a classe mais pobre é tratada legalmente como algo descartável e que pode ficar sujeita a todos os perigos que os mais ricos são poupados. Este efetivamente é um país da estupidez. Imaginem a situação de uma família pobre que tem quatro filhos com idade entre 4 e 7 anos. Mesmo que entendam que a nova lei traz segurança para suas crianças, onde vão colocar os assentos elevados que esta nova lei obriga? Na cabeça do gênio que fez a lei? Ou seria melhor a família do pobre coitado comprar outro veículo para transportar todos os seus membros? Tem mais: agora não se pode dar uma carona a uma mulher com um bebê de colo se não tiver a tal cadeirinha... Mas, ela pode pegar um táxi ou um ônibus, que estão desobrigados a ter esses dispositivos de segurança, não é um absurdo?
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Lembram da lei que obrigava o motorista a carregar um kit de primeiros socorros e que não pegou? Não sei... Tem alguma coisa parecida e que cheira muito mal nessa história, ou melhor, nessa lei, embora deva reconhecer sua capacidade de salvar ricas vidas. Esse tal kit de primeiros socorros deixou dezenas de empresários milionários. Tenho um guardado em casa como lembrança, caixinha azul e na época paguei 10 reais por ele. Comprei na estrada, quando viajava pela Anhanguera, de São Paulo para Franca, com receio de ser multado e ainda ter o carro apreendido. Era composto pelos seguintes materiais: dois rolos de ataduras de crepe, um rolo pequeno de esparadrapo, dois pacotes de gases, uma bandagem de tecido de algodão triangular, dois pares de luva de procedimento, uma tesoura de ponta romba. E a Lei do Trânsito é clara. É proibido colocar as mãos em acidentados para não agravar seu estado de saúde, deve-se preservar o local e chamar as autoridades competentes. Pergunto: para que servia então aquele bagulho a não ser enriquecer favorecidos do Poder?
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A resolução que obriga o uso de cadeirinhas em carros de passeio entraria em vigor em junho, mas teve de ser prorrogada por mais dois meses devido à falta do produto no comércio, dando chance para os motoristas se adaptarem. A partir do dia primeiro deste mês, independentemente de ter o produto nas lojas, a norma passou a valer. A lei é rigorosa com os pais que possuem carros e exige deles a compra de cadeirinhas e absoluto cuidado com os filhos.
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São três tipos de assentos diferentes até os sete anos e meio, cada um para certa idade e a multa vai chegar a quase R$ 200 e punição de sete pontos na carteira de habilitação. Hoje há modelos no mercado que variam de R$ 150 a mais de R$ 1 mil, valores altos para a população de baixa renda. E não há variedade de marcas populares, na avaliação da Associação Brasileira de Produtos Infantis. Para as crianças pobres que andam de ônibus isso não é exigido o que deixa implícito que o próprio Estado permite que as crianças de baixa renda sofram impactos violentos desde que os meninos de bem estejam protegidos.
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Como se não bastasse tal privilégio a Lei ainda é clara ao afirmar que em carros antigos, anteriores a 1998 que só possuem cintos de duas pontas que não aceitam as cadeirinhas, os motoristas estão isentos de multa. Ora, quem possui carro velho são os mais pobres e mais uma vez a questão financeira se sobrepõe a questão da vida. Se existem carros com cintos subabdominais que se obriguem os fabricantes a produzir equipamentos compatíveis com esse tipo de veículo. Mais ainda. Se a lei é para ser cumprida e pode salvar preciosas vidas, que seja estendida para todos os veículos, entre eles táxis e vans escolares. Eu pergunto: seu filho está mais seguro em um táxi ou no transporte escolar do que no carro do pai dele, do lado da mãe?
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Igualmente a Lei do Cinto não chegou aos coletivos e volto a perguntar: qual é a dificuldade de se instalarem cintos de segurança nos ônibus coletivos urbanos e exigir seu uso pelos passageiros como é feito em automóveis particulares? Poderia haver resistência no inicio como houve com os motoristas de carro, mas depois todo mundo se habituaria em caso de colisões e não teríamos mais as dezenas de acidentados, quase todos com lacerações na face porque simplesmente o cinto é coisa de rico. Para o Contran, pobre pode e deve esbagaçar-se no banco da frente dos coletivos, meter a fuça nas ferragens para deixar de ser pobre. O danado já se acostumou até a ficar em pé, espremido em ônibus lotados e não reclama, quer coisa mais errada? Sempre que acontece uma colisão com um destes ônibus urbanos, observem as notícias em jornais, o pobre é o primeiro a ser arrebentar todo, e depois, se der sorte e sair com vida, ainda se vê obrigado a enfrentar a fila do PS em busca de socorro...
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Nunca se viu tanto descaso pelos mais humildes que compõem a grande massa de nossa sociedade e acredito que poucos países teriam a coragem de excluir assim legalmente seus mais necessitados dos instrumentos e das normas de segurança apenas porque eles são pobres. No Brasil isso é feito de modo acintoso e com o aval da lei que distingue claramente quem pode ou não pode morrer, quem deve ou não deve acidentar-se baseado unicamente em sua renda financeira e nos seus bens materiais.
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ENTENDA A LEI

Crianças com até um ano devem utilizar, obrigatoriamente, o “bebê conforto ou conversível”. As crianças com idade superior a um ano e inferior ou igual a quatro anos devem andar na “cadeirinha”. Já as crianças com idade superior a quatro anos e inferior ou igual a sete anos e meio deverão utilizar o dispositivo de retenção denominado “assento de elevação”.
Somente a partir dos sete anos e meio, a criança pode ir sentada no banco usando o cinto de segurança do veículo.
No caso de veículos que só possuem banco dianteiro, caso das cabines de caminhonetes, é permitido o transporte de crianças com menos de dez anos no banco da frente, desde que viaje no dispositivo de retenção.
A multa para quem descumprir a nova regra é gravíssima. A punição é de sete pontos na carteira e multa de R$ 191,54. Na cidade, o carro fica retido até que se providencie a cadeirinha adequada. E durma-se com um barulho desses...
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*Edward de Souza é jornalista, escritor e radialista
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