terça-feira, 30 de junho de 2009

A CASA MAL-ASSOMBRADA DE PIRITUBA
INÉDITO - NOTÍCIAS POPULARES
EDWARD DE SOUZA
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O FEITIÇO VIROU-SE CONTRA O FEITICEIRO
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Segundo Capítulo
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As luzes dos postes já começavam a se acender e, no ar, sentia-se o cheiro do jantar, mas os moradores daquela rua em Pirituba não arredavam pé das proximidades da casa “mal-assombrada” e faziam até apostas para saber a hora em que o fenômeno se manifestaria. “Eu acho que é coisa do diabo”, dizia um antigo morador do bairro, fotografado pelo Tarcísio. Chegaram até a dizer que o fenômeno era uma tentativa de um vizinho, assassinado há um mês, de pedir ajuda. Os vizinhos contavam que a hipótese de fenômeno sobrenatural foi a primeira a ser levantada pelos donos da casa. Eles correram chamar o padre da igreja do bairro para ajudar a resolver o caso. Foi o padre que recomendou chamar a polícia e a imprensa.
Eu, que não acreditava em nada daquilo que os moradores diziam, muito menos em fantasmas que atiram pedras, começava a sentir certo incômodo naquela sexta-feira cinzenta e já fria. Raios e trovões cada vez mais fortes. Era preciso fazer alguma coisa antes que tudo ficasse às escuras. Enquanto eu olhava para a multidão e percebia a chegada de uma emissora de TV, um gato preto correu atravessando a rua, calçada a calçada e penetrou no jardim da casa, escondendo-se. Era o que faltava para tornar aquele dia mais tenebroso. Tarcísio, o fotógrafo, puxou-me pelos braços e sugeriu uma volta pelos fundos da casa. Caminhamos juntos até que ele recuou. Havia se esquecido do flash no carro de reportagem. Estranho, pensei. Um fotógrafo experiente esquecer-se do apetrecho principal para fotos no escuro. Segui em frente. Aproximei-me de um barranco cercado de árvores que balançavam forçadas pelo vento forte. Repentinamente um galho despencou de uma árvore. Passou pelo alto, mas só podia ter sido arrancado pelo vento, imaginei. Dei mais uns passos à frente e outros galhos vieram em minha direção. Senti pela primeira vez que alguma coisa anormal estava acontecendo. E o infeliz do fotógrafo não aparecia. Ouvi um barulho vindo das árvores. Segundos depois pedras começaram a cair. Uma delas, enorme, passou bem perto da minha cabeça. Para quem tinha um pingo de juízo, havia chegado o momento de recuar. Quase correndo, por pouco não atropelo o Tarcísio, que vinha em passos lentos com sua máquina a tira-colo. Contei o acontecido, mas o danado achou graça. Não acreditou, ou fingia não acreditar em nada daquilo que eu contava. Arrastei-o pelos braços até os fundos da casa e lhe mostrei pedras e galhos espalhados pelo chão. Segurando para não cair na gargalhada, Tarcísio se recusou a fazer fotos, alegando que não eram provas. E tinha razão. Pedras e galhos no chão podem ser encontrados em qualquer lugar. Irritado, fiquei por alguns minutos ao seu lado, esperando que o fenômeno voltasse a se manifestar. Nada aconteceu. Voltamos para a frente da casa e já era noite. Batemos na porta, mas ninguém atendeu. Estava claro que os moradores estavam ali, mas, assustados, preferiram se esconder, apenas observando a movimentação pelas frestas das janelas. O correto seria voltar no dia seguinte, bem cedo para tentar ouvir os moradores da casa. Uma chuva fina começou a cair. Mesmo assim, meus olhos permaneciam atentos, observando os fundos da casa. Tarcísio procurava chamar minha atenção indicando-me o padre, que conversava com o repórter de uma emissora de TV dando as suas explicações sobre o que vinha ocorrendo naquele lugar. Não me interessava o padre, pelo menos naquele momento e depois de ter passado todo aquele sufoco. O fenômeno teria que se manifestar novamente, pensava eu. Não aguentava a cara de gozação do Tarcísio. Nisso, enquanto olhava para os fundos da casa, ouvi gritos. Pedras começavam a cair. Não se sabia o lugar certo onde saiam, pareciam claramente lançadas do alto. Observei que caíam vertical, atravessando a folhagem das árvores nos fundos da casa. O rosto de Tarcísio transfigurou-se. O ar de deboche desapareceu e ele fotografava tudo que podia, até os curiosos que, assustados, corriam para se livrar das pedras que continuavam a ser lançadas. Repentinamente um grito dos fundos da casa chamou a atenção de todos. Até o padre, que havia terminado de dar sua entrevista para a TV, correu para ver do que se tratava. Uma figura conhecida, de paletó xadrez, bigodes ralos, havia despencado do barranco, segurando uma bolsa vazia nas mãos. Atingido de raspão na cabeça por uma pedra, “paletó”, nosso prezado motorista, entrou assustado no carro de reportagem. Ficou tudo claro. Um filme passou em segundos na minha mente. Na noite anterior, os dois, Tarcísio e “Paletó”, tramaram toda a brincadeira na padaria, por isso cortaram a conversa assim que me viram. E tiveram a paciência de encher uma bolsa com pedras para levar e me fazer de vítima. Os galhos, certamente “Paletó” encontrou no chão. O motorista só não esperava que o fenômeno realmente se manifestasse e o transformasse em vítima. O feitiço virou-se contra o feiticeiro.
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O fenômeno poltergeist ou RSPK (psicocinesia recorrente espontânea), como é tecnicamente chamado em Parapsicologia, é ainda um dos mais intrigantes assuntos estudados na área. Esse fenômeno envolve ocorrências físicas tais como chuvas de pedras, movimentação, quebra, pirogenia, aparecimento de água, sons, luzes e outros objetos, sem nenhuma explicação "normal" para esses eventos. Nesta quarta-feira, saibam como ”Paletó” se transformou em manchete do jornal mais vendido em bancas do Brasil. Nossa entrada na casa “mal-assombrada” entrevista com o casal e as panelas que se mexiam nas prateleiras, enquanto copos voavam para todos os lados. Leiam amanhã no blog.
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*Edward de Souza nasceu em Franca, é Jornalista e radialista. Trabalhou nos jornais, Correio Metropolitano, Diário do Grande ABC e O Repórter, da Região do ABC Paulista. Em São Paulo, na Folha da Tarde, Jornal da Tarde, Gazeta Esportiva, sucursal de “O Globo”, Diário Popular e Notícias Populares, entre outros. Atuou na Rádio Difusora de Franca, Difusora de Catanduva, Brasiliense de Ribeirão Preto, Rádio Emissora ABC e Clube de Santo André; também nas rádios Excelsior, Jovem Pan, Record, Globo – CBN e TV Globo de São Paulo. Medalha João Ramalho, principal comenda do município de São Bernardo do Campo, outorgada pela Câmara Municipal daquela cidade pelos relevantes serviços jornalísticos prestados à região. Troféu PMzito, entregue pelo alto comando da Polícia Militar de Santo André por ter se destacado como o melhor repórter policial do ABC nos anos 70. Prêmio Sanyo de Rádio nos anos 80, como o melhor narrador esportivo do ABC Paulista. Menção Honrosa entregue em 2007 pela Câmara Municipal de Franca e outra pelo Rotary Clube Norte pela atuação brilhante na radiofonia da cidade. Participou da antologia O Conto Brasileiro Hoje, 7°, 8º, 9º e 10º edições, com os contos “Um Visitante Especial”, “Sonhos Dourados” “A Lua de Mel” e “O Sacristão”, além de diversas outras antologias de contos e ensaios. Assina atualmente uma coluna no Jornal Comércio da Franca, um dos mais tradicionais do interior de São Paulo.
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