CONTOS E CRÔNICAS DA PÁSCOA
UM INESQUECÍVEL
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DOMINGO DE PÁSCOA
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Por que as pessoas não se empolgam mais com a Páscoa? Antigamente - na época de outrora, sabe? Aquela que os tempos não trazem mais - todos ficavam felizes quando a Páscoa se aproximava, já pensando na Sexta-Feira Santa e na tradicional bacalhoada regada a muito azeite português, batatas pré-cozidas com folhas de louro, pimentões vermelhos, azeitonas pretas, ovos cozidos, no melhor estilo da culinária portuguesa, acompanhada de couve e um arroz branquinho.

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Nesse período cristão recordo minha infância, quando meu irmão e irmãs

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Foi num bonito domingo de Páscoa com muito sol, há muitos anos, que toda minha família se reuniu na ampla casa térrea de meus pais, localizada perto da praça central de Franca. Eu tinha apenas 9 anos de idade e apenas duas irmãs haviam nascido, a Lúcia e a Lusineti. A Dalvinha e o Arlindinho viriam anos depois. Minha mãe Dalva, auxiliada por minhas tias ultimava os preparativos para servir um bom almoço de Páscoa, enquanto os homens conversavam e bebericavam no quintal, sob as sombras de frondosas jabuticabeiras.
Eu e as duas irmãs, depois da “caçada” aos ovos de chocolate,
brincávamos na rua. Fomos orientados severamente pela minha mãe, nada de abrir os ovos de chocolate antes do almoço. Deixei as guloseimas sobre minha cama e estava ansioso esperando o almoço ser servido, comer pouco e depois fazer a festa com os ovinhos de Páscoa, dois deles enormes, um que ganhei de meus pais e o outro da minha avó.

Meia hora antes do almoço minha mãe chamou os três para dentro de casa e nos fez tomar um belo banho. Deixou sobre minha cama, perto dos ovos de Páscoa - que tentação! – minha roupa mais bonita. E sentamos todos para almoçar. A mesa partia da copa e seguia até o final da enorme cozinha. Minha mãe, em pé, fez uma oração, acompanhada em silêncio por todos nós.
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Começaram a comer com vontade, estavam mesmo famintos. Acompanhei os meninos e comecei a conversar com os dois. Meu coração de criança estava sensibilizado, depois de ouvir a triste história que me contaram. Haviam perdido a mãe muito cedo, o pai, doente e desempregado não teve como pagar aluguel da casa que moravam e foram despejados. Moravam num barracão improvisado, na periferia da cidade. Com fome, em pleno Domingo de Páscoa, resolveram sair às ruas em busca de comida. Queriam também levar para o pai deles. Contei isso para minha mãe quando nos levantamos da mesa. 

Enquanto mamãe preparava comida para os meninos levarem para o pai, eu os levei até meu quarto. Os olhinhos dos dois brilharam ao ver tantos brinquedos e tantos ovos de chocolate jogados sobre minha cama. Pensei em dar um ovinho para cada um. Depois, segurando os dois ovos de chocolate maiores, um que ganhei de meus pais e o outro da minha avó, não vacilei. Dei um para cada um. Eles abraçaram os ovos, encantados, parecia que não estavam acreditando ser tudo aquilo verdade. Exclamei feliz: “podem levar, tenho outros”. Não havia percebido que mamãe estava encostada na porta. Olhou-me com aprovação e saiu.
Os meninos saíram de casa agarrados aos ovos de chocolate, com muita comida para levar e deixaram o endereço onde moravam. Meus pais e tios passaram a cuidar do pai doente e dessas crianças. Um dos meus tios deu emprego para ele em sua fábrica de calçados e a vida desses meninos melhorou. Marcos e Luiz. A última vez que me encontrei com eles faz uns 20 anos. Um é advogado, o outro arquiteto.

Ao invés de comer e beber tudo o que tem direito, a reunião familiar do domingo deveria continuar servindo para acertar diferenças, procurar no real significado da Páscoa, a meditação, o diálogo em paz, a harmonia e o perdão, pregados por Cristo.
FELIZ PÁSCOA!
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*Edward de Souza é radialista e jornalista
*Edward de Souza é radialista e jornalista
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