quinta-feira, 27 de agosto de 2009

CONTOS DO VIGÁRIO - GOLPE DE MESTRE

CAPÍTULO QUATRO
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Na maioria dos contos do vigário aplicados na década de 50, 60 e 70, o malandro aproveitava-se da ambição dos que se julgavam espertos e no fundo eram desonestos. Para convencer a vítima, o vigarista até gastava dinheiro. "O conto da guitarra" precisava de muito capital para ser aplicado. Um golpe de mestre, de muita audácia, cujo prêmio era ganhar dinheiro sem o mínimo esforço.
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O CONTO DA GUITARRA – O vigarista escolhe quase sempre um rico comerciante ou um fazendeiro e faz uma proposta. Explica que tem um amigo em São Paulo que faz notas de mil cruzeiros (o texto segue o original daquela época), mas que, depois de um certo tempo de atividades, tem encontrado dificuldades com a Polícia. Por causa disso, resolveu vender a máquina. Mostra algumas notas de mil cruzeiros para que sejam examinadas. Depois disto, propõe negócio. A vítima, depois de examinar atentamente o dinheiro "falso", conclui que é idêntico ao verdadeiro. Resolvem dar uma volta pela cidade, ocasião em que o vigarista troca com facilidade o dinheiro, fazendo algumas pequenas compras. Para terminar de uma vez com as poucas dúvidas que a vítima ainda tem, o vigarista dirige-se até a caixa de uma agência bancária, onde também troca o dinheiro. Depois disto vem a pergunta inevitável: "se a máquina imprime notas tão perfeitas, porque seu amigo quer vendê-la?" O vigarista conta que, com a perseguição da Polícia, ele anda bastante amedrontado, uma vez que já distribuiu milhares de notas falsas e não quer se arriscar a ser preso. Após as experiências e as explicações, o malandro diz que seu amigo está disposto a entregar a máquina por 500 mil cruzeiros (uma fortuna na época). Achando o preço muito alto, mas convencido, a vítima marca encontro em um lugar deserto com o proprietário da "guitarra". No dia e hora combinado, o dono da máquina chega com ela embrulhada e começam a discutir sobre a transação. Depois de desembrulhar a máquina – um rolo montado sobre uma caixa, movida por uma manivela – a vítima solicita uma demonstração. O vigarista introduz uma folha de papel branco do tamanho de uma cédula de mil cruzeiros, no lado esquerdo da máquina. Vira a manivela e sai uma nota novinha em folha. A demonstração é repetida diversas vezes, deixando a vítima entusiasmada. Não espera muito e entrega aos vigaristas o dinheiro combinado e corre para casa, carregando a caixa, satisfeito com o negócio realizado. Assim que chega, ansioso, enfia papéis brancos na máquina e começa a fabricação. Por algumas vezes consegue retirar notas de mil cruzeiros, mas depois a máquina para de "produzir", embora continue a consumir papéis.

O CONTO DO PACO – Embora a escola fundada por Antonio Teodoro não conseguisse formar muitos alunos na época, os vigaristas menores que atuavam junto as classes mais baixas deram asas à sua imaginação, criando contos simples, quase infantis, mas cuja eficácia era tanta que são usados até hoje. "O conto do paco", ou "cascata", necessita de muita conversa mole para enganar a vítima. Um caipira típico – roupa larga, lenço no pescoço, botina, cara de otário – aborda a vítima na rua. Pergunta sobre um determinado senhor, dizendo que veio do interior para entregar a ele um pacote, mas que perdeu o endereço. Nem bem acaba de falar, surge outro personagem em cena: um comparsa do vigarista que vinha passando por "acaso". Interessa-se pelo assunto, faz perguntas. O "caipira" repete a história, abre o pacote onde há um bolo de notas de 100 cruzeiros. O "passante", demonstrando surpresa, faz sinais para a vítima e dirige-se ao "caipira", dizendo que conhece muito bem a pessoa que ele procura, mas como mora longe, ele só poderá chegar lá à noite. O "caipira", muito preocupado, explica que não pode ficar muito tempo, uma vez que comprou passagem de volta para às seis da tarde. Então o "passante" – seu cúmplice – aponta para a vítima e diz que os dois poderiam entregar o pacote para ele. A vítima, vendo dinheiro tanto dinheiro fácil, geralmente concorda. O "caipira" reflete e prepara o segundo e decisivo golpe.
- Mas eu posso confiar nos senhores?
O "passante" se intromete e mostra que ele pode confiar.
- Amigo, eu tenho dinheiro, não vou furtar o senhor. E o rapaz aqui também tem, não é? Dê-me o seu dinheiro que eu enrolo nesse lenço, com o meu e o do companheiro. Dito isso, pega o dinheiro do "caipira", da vítima, o seu, enrola tudo num lenço. Rapidamente, sem que a vítima perceba, troca o lenço onde está o dinheiro por outro, previamente preparado. Entrega-o à vítima e afasta-se um pouco, para acabar de enganar o "caipira", dizendo: "espere ali na esquina que eu vou despachar o homem". Na esquina, a vítima, se é gananciosa, sai correndo, se não é, espera até cansar. Aí resolve abrir o lenço: somente papel velho.

O CONTO DO PAPAGAIO Certamente um dos mais conhecidos do Brasil. Existem duas versões para ele. Uma diz que no fim da guerra, em Belém do Pará, um malandro brasileiro vendeu a um soldado americano uma coruja como papagaio. Prefiro a segunda, até porque tem por trás o bom malandro carioca, acompanhe...
O Português vai à loja de animais de um carioca e fica abismado com um papagaio: "como esse seu bicho fala bem? Você não tem nenhum para me vender não?" O carioca, muito esperto, responde que sim, e pede para o português voltar no dia seguinte para buscar seu papagaio, avisando que iria custar bem caro. O português concorda com o preço, mesmo sendo um absurdo e promete voltar no outro dia para buscar sua ave. Logo que o português sai, o carioca pinta uma coruja de verde e fica esperando a volta do freguês. Assim que o português aparece, no outro dia, o carioca lhe entrega a coruja. E lhe dá a seguinte instrução: "você precisa conversar bastante com ela para que aprenda e comece a falar". Dias depois, o português volta até a loja e o carioca pergunta: " e então? O seu papagaio está falando muito?" O português responde: "olha, raios, falar, não fala, mas presta uma atenção!"
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Não perca nesta sexta-feira o capítulo final dessa série que fez enorme sucesso na década de 70. Entre os contos a ser apresentados, você vai conhecer um dos mais criativos daquela década: "O Conto do milionário". Um outro genial que acompanha esta última edição também será apresentado no blog: "O Conto das Jóias", além de outro engraçado e criativo que é "O Conto do Pastel" e "O Conto do Dinheiro Falso". Acompanhe esse quinto e último capítulo nesta sexta-feira.
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EDWARD DE SOUZA é jornalista, escritor e radialista
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