UMA PESCARIA FRACASSADA
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Primeira parte
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J. MORGADO
Rodovias Anhanguera, Washington Luiz, Brigadeiro Faria Lima, passando por Jaboticabal, Barretos até o Rio Grande, divisa entre São Paulo e Minas Gerais, foi o trecho inicial percorrido. A seguir, pela BR-050, Uberaba e Uberlândia. A partir daí, o cerrado com toda a sua exuberância, intocável, com sua fauna, riachos cristalinos e rios caudalosos. Mas, esperem um pouco... Isso foi em 1973. Tudo acabou! Cana, soja, etc. O cerrado? O cerrado... Sumiu! Ficaram os rios, acho eu!
Do entroncamento – Uberlândia – Brasília – Ituiutaba – seguimos em direção a esta última cidade e fomos adiante até alcançarmos a divisa com o Estado de Goiás, onde o Rio Paranaíba, mais abaixo, encontra-se com o Rio Grande, formando o majestoso Rio Paraná, despejando suas águas de mais de 500 metros de largura em um canal que não passa dos 80. Águas turbulentas e profundas. Outra maravilha da natureza desaparecida em nome da evolução ou da ganância...
Desde o entroncamento, a estrada era de terra e assim prosseguiria até o destino final. O cerrado, com sua flora típica, árvores retorcidas e floridas e animais silvestres encantavam-nos. O pescador amador é antes de tudo um amante da natureza e se aborrece quando tudo isso desaparece. No caminho, boiadas com seus boiadeiros. O berrante à frente. Quem viajava por essas estradas sabia com algumas horas de antecedência, que no caminho encontraria uma boiada. O “maleteiro”, um peão com sua animália carregando malas e engradados, se adiantavam algumas horas. Era o cozinheiro. No local destinado, geralmente a beira de um rio ou riacho, a bóia fumegante.
Depois de mais de 900 quilômetros percorridos, “arranchamos” em uma fazenda entre os municípios de Cachoeira Alta e Caçu, em Goiás. O dono da fazenda era meu amigo e lá ia eu ter vez outra passar alguns dias. Era época em que as perdizes, jaós e inhambus começavam a cantar. Seu canto era para atrair as fêmeas para o acasalamento. Suas “vozes” soavam de maneira como que nostálgica ou melancólica. Que saudade!
Pela manhã, partíamos. Centenas de quilômetros nos separavam do objetivo. Muitas alegrias e surpresas nos aguardavam durante o percurso. Os postos de gasolina em que abastecíamos a nossa Variant eram movidos a manivela. Sim, a manivela, não havia energia elétrica nessas estradas do sertão. A Variant estava pesada, além dos quatro marmanjos, toda a bagagem e mais um motor de popa. A conversa entre nós girava em torno de caçadas e pescarias. A cada animal silvestre que surgia na estrada era um frenesi. Veados, tamanduás, tatus, irararas, lagartos, etc. eram uma constante. Infelizmente, tudo acabou! E os culpados não foram os caçadores. A soja, a cana e sei mais lá o que, tomou conta de tudo. O cerrado, pobre cerrado... O bicho homem comeu! Os bandos de araras vermelhas, azuis... Maritacas, periquitos, papagaios, tucanos, coloriam o espaço a nossa frente! Procurávamos evitar que outro veículo passasse a nossa frente, se bem que eram poucos. O pó era terrível. Quando isso acontecia, as janelas eram fechadas senão teríamos que cuspir barro. Passamos por vários lugarejos com nomes interessantes. Lembro-me de termos feito refeições em Piranhas. Um pequeno município de Goiás. Caiapônia, entre outros lugares na região, começava a se desenvolver. Viajávamos entre as duas grandes bacias hidrográficas, a Platina e a Amazônica. Ora encontrávamos rios correndo para o sul, ora para o norte.
Enfim, chegamos a Aragarças, as margens do ainda tímido Rio Araguaia. Essa cidade foi outrora (se não estou enganado 1957/58), palco de uma rebelião militar, que como tudo aqui no Brasil, acabou em pizza. Do outro lado, Barra do Garças, município mato-grossense. Local onde estabelecemos contato com o tal amigo. Mas, essa segunda parte de nossa aventura eu conto amanhã, domingo, aqui no blog do Edward de Souza, prometo...
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*J. Morgado é jornalista, pintor de quadros e pescador de verdade. Atualmente esconde-se nas belas praias de Mongaguá, onde curte o pôr-do-sol e a brisa marítima. Morgado escreve quinzenalmente neste blog, sempre às sextas-feiras. E-mails sobre esse artigo podem ser postados no blog ou enviados para o autor, nesse endereço eletrônico: jgacelan@uol.com.br
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