terça-feira, 15 de dezembro de 2009

A CIDADE DE SÃO PAULO INVADIU OS RIOS

São Paulo terça-feira da semana passada esteve literalmente parado. Caos total. E não parava de chover. Na noite anterior, quando percebi que a chuva não parava, já sabia que não teríamos terça-feira, ou seja, dia útil. O dia tornou-se inútil, e pior, com gravíssimos prejuízos para a cidade, que depois vai pagar essa conta, com frutas e legumes mais caros, pois o Ceasa voltou a se transformar num lago só, com melancias e legumes boiando, uma tristeza. O pior é que favelados das imediações vão acabar se contaminando ao ingerir esses alimentos, como sempre acontece.
“O rio invadiu as marginais”, dizem equivocadamente nossos coleguinhas da TV. Errado: foi a cidade que muito antes invadiu o rio. Essas marginais jamais poderiam existir no lugar onde estão. É um retrato da incompetência das nossas autoridades, de qualquer época, com a conivência, ou ignorância, dos engenheiros.
Até uma criança é capaz de entender o problema: todo rio precisa de um espaço, que pode ter diferentes nomes, mas é tudo a mesma coisa: “área de enchente”, “várzea”, “cota de inundação”, etc.
Todos os anos, de novembro a março, ocorre no Sul-Sudeste a estação das chuvas. É óbvio que os rios vão transbordar. É assim na selva e em qualquer outro lugar do mundo. Todo rio transborda, é um fenômeno normal da natureza. Quando as águas depois baixam, naquelas várzeas geralmente brota uma vegetação exuberante e ali também proliferam bichinhos da terra, que fazem parte da sua riqueza, constituem seu organismo vital e maravilhoso.
Então, quando o homem na sua burrice e ganância invade esse espaço que é do rio, pavimentando tudo, acabando com a drenagem natural, matando essa riqueza do solo, vai ter como resposta da natureza o que seguidamente vemos em São Paulo. Sem ter para onde ir, o rio vai buscar seu espaço a qualquer preço: invade as ruas, casas, empresas. O Ceasa, por exemplo, jamais poderia estar ali. E não me venham dizer, por favor, que num país do tamanho do Brasil espaço é problema.
Não bastasse essa ocupação irregular das várzeas, por culpa sim das autoridades, que não só permitiram como também promoveram a ocupação, com dinheiro do contribuinte, há também o secular problema da falta de educação do povo, que joga todo tipo de lixo nas ruas e nos rios. Do simples papel de bala e todo tipo de detrito não degradável, a sofás e carcaças de carros velhos, tudo é jogado nos nossos rios. Depois não querem enchentes.
Outro problema é a encosta dos morros. É uma insanidade total construir casas nas encostas do morros. Mesmo com a vegetação, o morro sofre mutações permanentes, aquilo não é algo tão sólido como parece. Tanto que na Serra do Mar, onde há túneis e pontes, é necessário um monitoramente de engenharia e geologia permanente, para acompanhar as mutações. Ora, queridos leitores do Blog do Edward de Souza, a ocupação ilegal das encostas, aumentando a instabilidade do morro e causando seu desmatamento, vai agravar e potencializar um fenômeno que também é parte da dinâmica da natureza. É evidente que as chuvas vão tornar aquele terreno mais instável do que naturalmente já é. E isso ocasiona os deslizamentos, soterrando casas e pessoas, uma tragédia lamentável e que poderia ser evitada, como no caso das enchentes, com uma única e sensata decisão: respeitar sempre a natureza!
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EM TEMPO: Oito dias depois da enchente que atingiu a cidade de São Paulo, os moradores da região do Jardim Pantanal, na zona leste, continuam ilhados. Mau cheiro, ratos, água suja e esgoto tiram o sono dos quase 10 mil moradores afetados pela cheia. De forma improvisada, cada um tenta uma solução "caseira" para amenizar a situação. O local fica na várzea do rio Tietê e a previsão é de que a situação só se normalize no fim desta semana. A chuva que causou o alagamento na zona leste foi o equivalente a cerca de um terço de toda a precipitação esperada para o mês de dezembro, segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE). Decorridos apenas oito dias do início do mês, a cidade já registra um acumulado médio de 143,1mm, que reflete em 71,2% da média para o mês. Segundo a subprefeitura, até agora 9.907 pessoas foram atendidas e 157 foram encaminhadas para abrigos da prefeitura. A prefeitura já distribuiu cestas básicas, colchões e cobertores nas áreas afetadas.
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*Milton Saldanha, 64 anos, é jornalista e dono de notável memória, que adora manter sempre viva.
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